16/05/2021

17 - A motivação do amor - Parte 2

 


 

Filemom 1.17 a 25 Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa. Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês. Epafras, meu companheiro de prisão por causa de Cristo Jesus, envia-lhe saudações, assim como também Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus cooperadores. A graça do Senhor Jesus Cristo seja com o espírito de todos vocês”.

Cartas da Prisão

Na aula anterior nó vimos o testemunho de John Bunyan: que por 12 anos se viu privado de sua liberdade por se recusar a dizer que nunca mais pregaria o evangelho. Na prisão, conquanto estivesse mentalmente massacrado por saber que sua família estava privada de sua presença, provisão e proteção, Bunyan não desperdiçou seu tempo, mas nos abençoou com a composição de nada menos do que nove livros, dentre os quais se destaca O Peregrino.

A inspiração para aquele puritano, escritor e pastor batista era o apóstolo Paulo, o qual, durante seu primeiro encarceramento em Roma, escreveu nada menos que Efésios, Filipenses, Colossenses e Filemom. A carta a Filemom tem sido nosso objeto de estudo, e nesta que é a 17ª lição da série, nós concluiremos o tema: a motivação do amor. Concluiremos também o estudo expositivo desta carta.

Há no texto que lemos pelo menos cinco motivações para se perdoar:

A visibilidade do evangelho (vs. 17 a 19); a possibilidade de abençoar (v. 20); a necessidade de obediência (v. 21); a importância de se manter comunhão (vs. 22 a 24); a medida da graça que recebemos de Cristo (v. 25).

As duas primeiras nós já estudamos. Agora nós nos debruçaremos sobre as três últimas.

3 - A necessidade de obediência

O terceiro motivo para se amar a tal ponto de perdoar é o reconhecimento de que o cristão é chamado a ser obediente ao Senhor Jesus Cristo. Com efeito, o discipulado cristão consiste, essencialmente, em se guardar ou se obedecer a tudo quanto o Senhor nos ordenou (Mateus 28.20). Quem ama Jesus, obedece a Jesus e quem não o ama, não o obedece (João 14.23 e 24). Uma das coisas que o Senhor nos ordenou foi que perdoássemos aos que nos ofendem (Mateus 6.14 e 15). Então, sabedor de que Filemom era um discípulo fiel do Senhor Jesus Cristo, Paulo pôde lhe escrever, versículo 21 “Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço”.

O apóstolo está tocando novamente no coração de Filemom sobre a necessidade de se obedecer a Deus. Paulo não está falando sobre Filemom ser obediente a ele mesmo, Paulo. No início da carta, você se lembrará, o apóstolo já tinha escrito, versículo 8 “Por isso, mesmo tendo em Cristo plena liberdade para mandar que você cumpra o seu dever”, que nunca forçaria imporia obediência a Filemom, mesmo estando investido de toda a autoridade apostólica. Para o apóstolo bastava saber que Filemom era um crente fiel. Ele conhecia as características daquele irmão (vs. 4 a 7). Portanto, estava confiante de que Filemom agiria de maneira correta e obedeceria a ordem de Deus para se perdoar.

Àquela altura, o bom discípulo de Paulo já conhecia o mandamento do Senhor sobre a quantidade de vezes que se deve perdoar: “setenta vezes sete” (Mateus 18.21 e 22). Jesus, aliás, disse assim: “Mesmo que ele peque contra você sete vezes por dia e, a cada vez, se arrependa e peça perdão, perdoe-o” (Lucas 17.4). Diante desse dever, humanamente impossível, os apóstolos desabafaram: “Faça nossa fé crescer”! (Lucas 17.5). O Senhor, então, os ensinou a dar pequenos passos de fé, mesmo que apenas do tamanho de um grão de mostarda, nessa tarefa de perdoar (Lucas 17.6).

Filemom também já estava familiarizado com a convicção do apóstolo Paulo, impressa em 2 Corintos 2.7 e 8, de que o perdão, o conforto e a reafirmação do amor são essenciais ao pecador quebrantado e arrependido. Ele certamente tinha certeza do que Paulo dissera aos efésios e também aos colossenses:

Efésios 4.31 e 32 “Livrem-se de toda amargura, indignação e ira, gritaria e calúnia, bem como de toda maldade. Sejam bondosos e compassivos uns para com os outros, perdoando-se mutuamente, assim como Deus perdoou vocês em Cristo”.

Colossenses 3.12 a 15 “Portanto, como povo escolhido de Deus, santo e amado, revistam-se de profunda compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência. Suportem-se uns aos outros e perdoem as queixas que tiverem uns contra os outros. Perdoem como o Senhor lhes perdoou. Acima de tudo, porém, revistam-se do amor, que é o elo perfeito. Que a paz de Cristo seja o juiz em seus corações, visto que vocês foram chamados a viver em paz, como membros de um só corpo. E sejam agradecidos”.

Filemom sabia que Deus ordena o perdão. Paulo tinha certeza de que ele tinha conhecimento desse dever, por isso que ele não escreve expressamente sobre o perdão nesta carta pessoal. Filemom, por exemplo, já teria lido Colossenses 3 (cf. Colossenses 4.7 a 18), e Paulo, com base no que conhecia de Filemom (Filemom 4 a 7) estava certo de que ele obedeceria e perdoaria Onésimo, estou “certo de que você fará (obedecerá) o que lhe peço, e até mais” (Filemom 21). Paulo estava certo de que Filemom obedeceria de forma a tornar visível o evangelho e a abençoar a todos os envolvidos, especialmente a Paulo e a igreja em Colossos.

Note ainda que ele diz: “Filemom, estou certo de que você será obediente e perdoará Onésimo, mas eu sei também que você fará até mais do que lhe peço” (v. 21). Até mais o quê, Paulo? Talvez, concedendo liberdade ao agora irmão em Cristo, matando um bezerro cevado e fazendo uma festa de celebração pela vida que fora alcançada pelo amor de Deus Pai, transformada pela graça de Deus Filho e que agora desfrutava da comunhão e da consolação de Deus Espírito Santo.

A necessidade de se obedecer a tudo que Jesus nos ordenou é uma motivação para amarmos e perdoarmos com fé. Essa obediência promove libertação e celebração.

4 - A importância de se manter comunhão

Outra motivação para se perdoar em amor é a importância de se manter comunhão com o corpo de Cristo. Paulo deixa isso tudo muito claro, como se segue, versículos 22 a 24 “Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês. Epafras, meu companheiro de prisão por causa de Cristo Jesus, envia-lhe saudações, assim como também Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus cooperadores”.

Paulo tinha a certeza de que o processo legal contra ele era muito fraco e que seria, em breve, posto em liberdade (cf. Filipenses 2.23 e 24), tanto que pede a Filemom que fique na expectativa de em breve recebê-lo em sua casa e, assim, em favor dele, permanecesse em oração (v. 22). Temos aqui um apelo muito sutil por parte de Paulo, “Por favor, prepare um quarto para mim, pois espero que minhas orações sejam respondidas e eu possa voltar a visitá-lo em breve” (v. 22).

Comentando sobre esse versículo, J. B. Lightfoot escreveu que “há um leve constrangimento nessa menção de uma visita pessoal a Colossos. O apóstolo poderia, assim, checar por si mesmo se Filemom não havia decepcionado suas expectativas”. (Citado por John MacArthur, p. 229). Para que essa doce comunhão não fosse quebrada, melhor seria se Filemom atendesse ao apelo de Paulo. O apóstolo, inclusive, menciona que estava orando por tudo isso, “espero que minhas orações sejam respondidas” (v. 22), e Filemom jamais seria capaz de orar no mesmo sentido, caso não estivesse disposto a perdoar Onésimo.

É importante, de passagem, falarmos um pouquinho sobre o meio pelo qual Paulo esperava que tudo aquilo acontecesse: a oração dos santos. John MacArthur Jr., pregando sobre este texto, fez o seguinte comentário a respeito de Filemom 22:

“Isso é maravilhoso. Ele sabe que a soberania de Deus realiza seus propósitos, mas também sabe que a soberania de Deus realiza seus propósitos por meio da oração. Ninguém pode estudar sobre a oração sem estudar esse versículo. Paulo diz “minha esperança é que eu seja liberto e possa visitar, e o meio de eu voltar a visitá-lo será através de suas orações”.

Como eu disse em anos anteriores, orações movem Deus. Orações são os nervos que movem os músculos da onipotência. A oração não é um exercício de inutilidade, posto que Deus fará o que ele deve fazer; a oração é o meio pelo qual Deus fará o que ele deve fazer. “A oração de um justo tem grande poder e produz grandes resultados”, como nos diz Tiago 5.16. Paulo estava muito ciente da obra providencial de Deus. Ele se referiu a essa soberana providência no versículo 15, quando presumiu que talvez Onésimo tivesse até mesmo fugido para poder voltar a Filemom como cristão. Paulo sabia que Deus estava trabalhando em tudo isso, e ele diz: “Minha esperança é que Deus me deixe ir até você e os meios para isso serão através de suas orações”. O apóstolo não apenas disse à Filemom que estava indo, mas demonstrou o meio pelo qual ele chegaria: “Filemom, comece a orar por minha chegada”.

Enquanto Filemom orava, Deus agia para libertar Paulo da prisão em Roma, ao mesmo tempo que agia para libertar o próprio Filemom da prisão da falta de perdão. Assim, a comunhão entre ambos era preservada e cultivada. A oração é a liga da comunhão.

A vida cristã não é para ser vivida em um vácuo. Cristãos não agem sozinhos, independentes de comunhão. Filipe Fontes foi muito acertado em uma postagem que fez no Twitter (@filipecfontes) no dia, 20 de agosto de 2020. Disse ele, que é Doutor em Educação, Arte e história da Cultura pela Universidade Mackenzie: “Se o mundo todo é o ambiente de serviço a Deus e o campo de batalha, a igreja é o ambiente de preparo e o quartel general. Abandone a igreja sob a desculpa de servir a Deus no mundo e rapidamente você estará servindo, no mundo, a outro deus”.

A comunhão dos santos na igreja local é importante para a nossa sobrevivência. Paulo deixa isso muito claro, ao destacar para Filemom os homens de sua comunhão pessoal naquele momento de sua vida, ao mesmo tempo que colocava Filemom devedor a eles também, tanto quanto à Paulo. Ah, a importância de se manter comunhão! Ouça, mais uma vez, versículos 22 a 24 “Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês. Epafras, meu companheiro de prisão por causa de Cristo Jesus, envia-lhe saudações, assim como também Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus cooperadores”.

Cinco homens (contando Paulo eram seis). Cinco homens preciosos para Paulo. Cinco homens preciosos para Filemom. Cinco homens que Filemom conhecia muito bem. Cinco homens que conheciam Filemom muito bem. O que Paulo estava dizendo?

O apóstolo estava afirmando que Filemom não poderia tomar sua decisão, não poderia agir independentemente da comunhão dos santos. Filemom não poderia agir sozinho. Se ele agisse sozinho e não perdoasse, quebraria o vínculo de amor que existia entre ele e aqueles homens de fé. Frustraria as expectativas deles sobre a sua pessoa. Daria a eles um mau exemplo. Mancharia seu testemunho. Portanto, não poderia fazer apenas o que sentisse vontade de fazer, como se existisse ou vivesse sozinho e sem ter que dar satisfação a ninguém. Filemom não tinha um nível de responsabilidade apenas para com aquele que era seu líder espiritual (Paulo), havia também um nível de responsabilidade que o fazia ter que estabelecer um padrão de conduta para aqueles que eram seus amigos espirituais.

Cinco homens. “Eles enviam saudações, Filemom. Eles têm grandes expectativas a respeito de você”. Ah, a importância de se manter comunhão no contexto da igreja local! Um tipo de comunhão que nos fortalece em Cristo, nos encoraja pelo evangelho, nos exorta em amor, nos faz prestar contas uns aos outros e requerer contas uns dos outros, impedindo-nos de fazer o que nos dá na cabeça como se não tivéssemos que prestar contas a ninguém. Eu te pergunto: Quem são os cinco da sua vida? A quem na igreja você presta contas de sua caminhada cristã? Com quem você ora? Quem ora por você? Ah, esse momento de “igreja virtual”! Deus nos livre disso vir para ficar! Que desgraça seria para a saúde dos crentes! Você precisa da comunhão da igreja de Jesus Cristo.

Portanto, submeta-se aos seus líderes, como está dito em Hebreus 13.17 “Obedeçam aos seus líderes e submetam-se à autoridade deles. Eles cuidam de vocês como quem deve prestar contas. Obedeçam-lhes, para que o trabalho deles seja uma alegria e não um peso, pois isso não seria proveitoso para vocês”.

Submeta-se também aos irmãos de fé, como Paulo colocou em Efésios 5.15 a 21 “Tenham cuidado com a maneira como vocês vivem; que não seja como insensatos, mas como sábios, aproveitando ao máximo cada oportunidade, porque os dias são maus. Portanto, não sejam insensatos, mas procurem compreender qual é a vontade do Senhor. Não se embriaguem com vinho, que leva à libertinagem, mas deixem-se encher pelo Espírito, falando entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de coração ao Senhor, dando graças constantemente a Deus Pai por todas as coisas, em nome de nosso Senhor Jesus Cristo. Sujeitem-se uns aos outros, por temor a Cristo”.

Ah, a importância da comunhão e da prestação de contas, a importância de se manter comunhão na igreja local! Sem a igreja, sem os irmãos e a comunhão da igreja, ou ainda, com um pé na igreja e outro sabe-se lá onde, o risco que se corre é o de se perder de forma irreversível. Considere comigo a lista de cinco nomes dos homens de Paulo. Preste bastante atenção na importância da igreja local na perseverança dos santos para a salvação.

Os cinco homens citados por Paulo em Filemom 23 a 24 também são mencionados em Colossenses 4.9 a 14. Além deles (Epafras, Marcos, Aristarco, Demas e Lucas), Paulo citou também na outra carta os seguintes: Tíquico (Colossenses 4.9) e Jesus, chamado Justus (Colossenses 4.11). Sobre esse último, nada se sabe. Provavelmente fosse um nativo de Roma e desconhecido de Filemom. Tíquico, que foi mencionado em Colossenses, não é mencionada na carta a Filemom. Servindo como o carteiro que entregaria as duas cartas (Colossenses e Filemom), certamente que ele mesmo entregaria sua saudação, pessoalmente, a Filemom. (Fonte: MacArthur, p. 230).

A lista de nomes a Filemom começa com Epafras, que foi mencionado em Colossenses 4.12 e 13, onde se lê a seu respeito “Epafras, que é um de vocês e servo de Cristo Jesus, envia saudações. Ele está sempre batalhando por vocês em oração, para que, como pessoas maduras e plenamente convictas, continuem firmes em toda a vontade de Deus. Dele dou testemunho de que se esforça muito por vocês e pelos que estão em Laodiceia e em Hierápolis”. Epafras deve ter se convertido sob o ministério de Paulo. É provavelmente o organizador da igreja de Colossos e das outras duas igrejas mencionadas pelo apóstolo: em Laodiceia e em Hierápolis (Colossenses 4.13). Ele próprio era de Colossos, certamente bem conhecido de Filemom. Deveria ser o presbítero ou pastor titular da igreja (Colossenses 1.7 e 8) que se reunia na casa de Filemom, que também era presbítero. Paulo fala muito bem dele aos colossenses (1.7 e 8; 4.12 e 13): servo fiel de Jesus, homem de serviço incansável, doutrinador de mão cheia e muito fervoroso na oração. A tradição nos dá conta de que morreu como mártir na cidade onde serviu como pastor a vida toda, Colossos. (MacArthur, p. 230).

O segundo nome da lista é Marcos. Ele é mencionado em Colossenses 4.10 como o primo de Barnabé. A igreja colossense é instruída a, caso ele fosse até eles, recebê-lo bem. A informação de que João Marcos era primo de Barnabé talvez nos ajude a explicar algo do conflito em Atos 15. Você deve se lembrar: quando Paulo e Barnabé estavam em viagem missionária (Atos 13.13), João Marcos os acompanhava. O problema era que, aparentemente, o jovem temia dificuldades, e decidiu os abandonar. Quando mais tarde a dupla missionária decidiu que viajaria para visitar as igrejas organizadas, Paulo se recusou a atender o desejo de Barnabé, que queria levar com eles João Marcos. Desentenderam-se e se separaram (Atos 15.36 a 39). O fato de ser primo de João Marcos talvez explique por que Barnabé tomou as dores e saiu em defesa do jovem que antes os havia abandonado no campo missionário. Graças a Deus, porém, Marcos melhorou muito nessa época. Por meio daquela forte disciplina de Paulo, ele aprendeu grandes lições e amadureceu. Provavelmente o tenha ajudado a forte influência de Pedro sobre sua vida, que o chama de filho na fé, “meu filho Marcos” em 1 Pedro 5.13. Conta a tradição que, sob os cuidados de Pedro em Roma, Marcos escreveu seu Evangelho a partir de sermões que eram pregados pelo apóstolo. Então, sob a tutela de Barnabé e de Pedro, Marcos deu a volta por cima e se tornou outro homem. Era tamanha a transformação que em 2 Timóteo 4.11, quando Paulo estava no fim de sua vida e escreveu a Timóteo, ele disse: “Traga Marcos com você, pois ele me será útil no ministério”. A comunhão sob a qual Marcos plantou sua vida o ajudou a crescer e perseverar até o final. Conta a tradição que ele foi pastor na cidade de Alexandria no Egito, e que, em 68 d.C., perseguidores do evangelho amarraram corda em seu pescoço e o arrastaram pelas ruas da cidade até que ele morresse enforcado e esfolado. (Por que 4 Evangelhos? David Allan Black. Editora Vida: 2004).

O terceiro da lista é Aristarco. Foi um dos pouquíssimos judeus convertidos ao cristianismo (Colossenses 4.10 e 11) a servir ao lado de Paulo. Era natural de Tessalônica (Atos 20.4; 27.2). Esteve com Paulo em Éfeso durante sua terceira viagem missionária e sua longa permanência por lá, ensinando o evangelho. Foi, juntamente com Gaio, capturado pelos desordeiros efésios em Atos 19.29, e estava com Paulo na viagem que resultou em naufrágio em Atos 27.4. Colossenses 4.10 nos informa de que esteve com Paulo na prisão, talvez voluntariamente, colocando-se em cativeiro para servir ao apóstolo em suas necessidades. De acordo com a tradição, foi martirizado em Roma, sob a perseguição de Nero.

A lista de Paulo também traz o nome de Lucas, “o médico amado” (Colossenses 4.14). É assim que ele é conhecido: “Lucas, o médico amado”. Crente, cheio de amor e autor do terceiro Evangelho, esse foi Lucas. Note um fato interessante: desses cinco, dois deles escreveram Evangelhos: Marcos e Lucas, e eles estavam juntos com Paulo. Lucas costumava ser o companheiro de viagem de Paulo, pelo que escreveu também o livro de Atos dos Apóstolos. Sempre ao lado de Paulo, até o final (2 Timóteo 4.11), certamente cuidou com muito carinho da saúde do apóstolo aos gentios. Conta-se que ele morreu servindo a Cristo na Grécia, com idade já avançada, contando cerca de 85 anos.

O último da lista de Paulo é Demas (Colossenses 4.10). Escrevendo a Filemom, Paulo o cita como colaborador em penúltimo lugar, antes do nome de Lucas (Filemom 24). Pouco se sabe sobre Demas, e a única coisa que se sabe é muito triste. Em 2 Timóteo 4.10, Paulo escreveu: “Demas me abandonou, pois ama as coisas desta vida e foi para Tessalônica”. Lamentável! O apóstolo João escreveu assim em sua epístola, 1 João 2.15 “Não amem o mundo nem o que nele há. Se alguém amar o mundo, o amor do Pai não está nele”. Demas, por amar o mundo, apostatou da fé. Apesar de que aqui, tanto em Colossenses como em Filemom, ele aparece como colaborador de Paulo no evangelho. Meu Deus! Tão perto, mas ao mesmo tempo tão longe! Tão familiar, mas tão perdido! Totalmente perdido. Perdido dentro da casa de Deus! Demas, ao contrário dos outros quatro, não perseverou. Não soube desfrutar da comunhão. Amou mais o mundo. Deixou tudo e todos e abraçou o mundo para a sua perdição. Demas serve de advertência para nós todos. Até mesmo líderes na cabeça de ministérios podem ser verdadeiros apóstatas, ao que parece. Devemos ler sobre a história de Demas como um aviso, um ultimato para não abusarmos da graça de Deus nem pensarmos que por termos algum lastro de qualquer natureza na engrenagem ou na tradição da igreja estejamos seguros por causa de nosso perfil, reputação, serviços prestados ou mesmo posição privilegiada que ocupamos dentro da igreja de Jesus Cristo. Ouça a advertência da história de Demas!

Pouco tempo depois da composição da carta aos Colossenses e a Filemom, Paulo foi liberto e deu continuidade ao seu ministério. Porém, foi preso novamente quando estava em Trôade, foi tão abrupta a prisão que nem deu tempo de ele colocar na mala sua capa, livros e pergaminhos (2 Timóteo 4.13). O apóstolo foi martirizado em Roma por volta de 67 d.C. Foi quando estava nessa segunda prisão, e da qual ele nunca mais saiu, senão para ser morto, que o apóstolo lamentou a apostasia de Demas, afirmando que ele, movido pelo amor ao presente século, foi para Tessalônica (2 Timóteo 4.10). Ora, Tessalônica era uma cidade portuária, o maior e mais movimentado centro comercial da Macedônia. Lá Demas certamente encontrou tudo de que precisava para satisfazer suas paixões.

Uma pergunta não me saía da cabeça neste ponto: como saber se estamos amando o presente século, a ponto de abandonar tudo como Demas apostatou? Bem, penso que estamos amando este mundo quando começamos a ver as coisas de forma distorcida.

Primeiro: as ofensas que cometemos contra Deus. A respeito desses pecados, nós apenas racionalizamos, pensando que não são tão sérios assim, argumentando que todos fazem a mesma coisa, achando que Deus não os leva tão a sério assim.

Segundo: as ofensas que os outros comentem contra nós. Essas coisas tomam um tamanho desproporcionalmente maior do que o devido, “Como a pessoa foi capaz de fazer isso comigo”! Simplesmente não nos importamos mais tanto assim com a santidade de Deus e não praticamos o perdão.

Resultado: nosso amor não perdura, nosso amor por Deus e pelo próximo não persevera; é sinal de que estamos apaixonados pelo mundo, por este presente século! Cuidado, crente! Muito cuidado! Pare de amar este mundo.

As cinco pessoas sobre as quais aprendemos eram muito próximas e queridas de Filemom, sem contar o próprio apóstolo Paulo. Havia comunhão entre eles todos. Se Filemom não perdoasse Onésimo, aquela atitude destruiria o vínculo da paz com aqueles homens. Veja você, nossas atitudes sempre estão interligadas. Se você guarda rancor, você quebra sua comunhão, com Deus e com o próximo. O perdão é importante para se manter comunhão, sem a qual, o caminho para a perdição se abre a tal ponto de nos engolir. Lembre-se da história de Demas.

5 - A medida da graça que recebemos de Cristo

Já neste ponto da carta, Filemom certamente estaria convencido de sua necessidade de perdoar Onésimo. No entanto, como é comum a qualquer um de nós, mortais pecadores, ele poderia estar pensando: “Mas eu não consigo perdoar! Preciso de força para perdoar”! Paulo, então, artesão de palavras, anota sua bênção apostólica tradicional na forma de uma oração por Filemom (e por toda a igreja que estava envolvida em ajudar Filemom, preste atenção no pronome que está no plural). Versículo 25 “A graça do Senhor Jesus Cristo seja com o espírito de todos vocês”.

Essas são as palavras finais de Paulo a Filemom. O apóstolo sabia que o que ele havia orientado Filemom a fazer era impossível de se fazer sozinho e na força da carne. A natureza humana não perdoaria aquela ofensa. Assim, Filemom, sua família e a igreja toda em Colossos precisariam se unir para, com a força que vem da “graça de nosso Senhor Jesus Cristo”, perdoar Onésimo. Aquilo que não era possível apenas pela força de vontade, posto que a vontade humana inclinaria para a vingança. Não era possível apenas pela lei, posto que a lei faria justiça. Seria possível pela graça, a graça do Senhor Jesus Cristo, trabalhando com o espírito, o homem interior, inclinando o coração de todos para a possibilidade do perdão, fazendo-os lançar as dívidas de Onésimo na cruz de Cristo.

Povo de Deus, em Cristo, somente em Cristo, nós somos perdoados por Deus e recebemos poder para perdoar aqueles que nos têm ofendido. O amor de Deus Pai nos encontra na cruz de Cristo. Também na cruz, justiça é feita. Esse amor que provamos de Deus em Cristo nos constrange a perdoar, e o preço que Jesus pagou nos convida a lançar sobre ele todas as dívidas de nossos devedores, porque é lá na cruz o lugar do pecado, tanto o nosso como o dos outros. Portanto, a medida da graça que recebemos de Cristo nos motiva a perdoar.

A motivação do amor

Paulo, que estava preso injustamente, escreveu a Filemom para o instruir na prática do perdão. Que forma maravilhosa de aproveitar seus dias amargos! Que forma amorosa de servir ao irmão. O apóstolo, então, escreve e diz: Você deve perdoar Onésimo, Filemom. A motivação para você perdoar está em que o seu amor na forma de perdão, além de ser necessário (uma vez que você é cristão), torna visível o evangelho através de sua vida, possibilita você a abençoar, é importante para você manter comunhão, e também por causa da medida da graça que você recebeu de Cristo. Perdoe Onésimo, Filemom. Perdoe.

Começamos esta mensagem citando John Bunyan. Vamos termina-la com a história do que aconteceu com ele após sua libertação definitiva da prisão em 1675. Bunyan se tornou o pastor de sua igreja, Igreja Batista, em Bedford. Ensinou com fidelidade a palavra de Deus ao seu rebanho, além de ter escrito, debatido e evangelizado bastante.

Os anos correram e em 1688 um jovem vizinho de Bunyan o abordou e lhe contou que ele estava brigado com o pai. O rapaz implorou ao pastor que fosse com ele até o pai e mediasse a reconciliação. O problema é que o pai do moço morava em Reading, cerca de 80 km de Londres, aonde Bunyan deveria estar no domingo para pregar. Lembre-se, estamos falando de fins do século XVII, Bunyan já contava quase 60 anos, cansado e viajando no lombo do cavalo. Persuadido de que deveria ajudar, ignorou os sacrifícios e foi assim mesmo. Foi bem-sucedido em sua missão e obteve a reconciliação entre pai e filho.

Cavalgando de volta para Londres, onde deveria pregar no domingo, Bunyan foi pego por uma chuva muito forte, um verdadeiro temporal. Não estava se sentindo bem, quando chegou ao seu compromisso. Mesmo assim pregou, com a mesma desenvoltura de sempre. Após terminar a mensagem, ele estava se sentindo miseravelmente doente. Desenvolveu uma pneumonia e nos dias seguintes veio a falecer, aos 31 de agosto de 1688.

Eu amo o fato de que John Bunyan gastou suas últimas energias trabalhando pela reconciliação. É muito parecido com Paulo, muito parecido com seu mestre! O homem que havia injustamente passado 12 anos na prisão, uma vez livre, atuou incansavelmente para promover reconciliação: entre o homem com Deus, e o homem com seu próximo.

O último sermão que ele pregou, lá em Londres, após a viagem de reconciliação, baseado em João 1.13 “os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus” (ARA), levantou um ponto que merece nossa atenção:

“Se vocês são filhos de Deus, vivam juntos com amor; se o mundo briga com você, não importa; mas é triste se vocês brigam uns com os outros na comunhão; se estiver acontecendo entre vocês, é um sinal de má educação; não está de acordo com as regras que vocês têm na palavra de Deus. Você vê uma alma que tem a imagem de Deus nela? Ame essa pessoa, ame-a; diga: esta pessoa e eu devemos ir juntos para o céu um dia. Sirvam uns aos outros, façam o bem uns aos outros; e se alguém cometeu algum mal contra você, ore a Deus para corrigir você e ame a irmandade”. (John Bunyan, Bunyan’s Last Sermon, vol. 2, Bellingham, WA: Logos Bible Software, 2006, p. 758).

Que maneira maravilhosa de gastar suas últimas energias nesta vida: sem amargura no coração (mesmo que tenham lhe privado de 12 anos felizes de sua vida com sua família!), sem rancor ou amargura na alma, servindo e promovendo a reconciliação em Cristo, pregando e instruindo o povo santo a viver, pregar e praticar o amor de Cristo. Assim foi com John Bunyan, com o apóstolo Paulo, com Jesus Cristo, nosso Senhor.

Será com você?

16 - A motivação do amor - Parte 1

 


 

Filemom 1.17 a 25 Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa. Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês. Epafras, meu companheiro de prisão por causa de Cristo Jesus, envia-lhe saudações, assim como também Marcos, Aristarco, Demas e Lucas, meus cooperadores. A graça do Senhor Jesus Cristo seja com o espírito de todos vocês”.

Cartas da Prisão

John Bunyan, pregador e escritor batista, viveu no século XVII, entre 1628 e 1688 na Inglaterra. Teve pouca educação escolar. Era muito pobre. Seguiu os passos do pai na profissão e trabalhou como funileiro, consertando potes e panelas quebrados. Sua especialidade, portanto, eram peças de barro, ferro e madeira que lhe eram levados para reparos. Após servir o exército (dos 16 aos 19 de idade), casou-se aos 20 anos, em 1649. Viveu em Elstow até 1655, quando sua esposa morreu, deixando-lhe quatro filhos. Mudou-se com a família para Bedford, cerca de 80 quilômetros ao norte de Londres, e se casou pela segunda vez.

Converteu-se ao cristianismo pouco antes de completar 25 anos, durante os anos do primeiro casamento. Logo começou a pregar como um leigo, isto é, sem treinamento teológico ou ordenação ao ministério da Palavra. Bunyan rapidamente percebeu o quanto sua pregação era popular, posto que cada vez mais recebia convites de todos os lugares para ir pregar. Também se destacou imediatamente como escritor de obras polêmicas por contestar o status quo religioso do anglicanismo, que era a Igreja da Inglaterra.

Àquela época, a Inglaterra estava em guerra civil. Como o rei havia sido deposto, o país estava sendo governado pelo militar Oliver Cromwell. Cromwell morreu em 1658 e seu filho liderou a nação por mais algum tempo. Carlos II, esperando em Paris, cruzou o canal de volta e foi recolocado no trono como o rei da Inglaterra em 1660. Em outubro daquele mesmo ano, foi ordenado que o Livro de Oração Comum, cartilha oficial da Igreja Anglicana, fosse adotado e lido nos cultos de todas as igrejas de Bedfordshire, que era o condado de Bunyan. Durante o tempo em que a nação ficou sem rei, houve grande liberdade religiosa para que se fizesse tudo o que se achasse edificante como cristãos, desde que não fosse o catolicismo romano (ou seja, não havia tanta liberdade assim); mas fora isso, era permitido qualquer expressão de culto cristão com decência e ordem. No entanto, com a ascensão do rei ao trono e a implementação da nova liturgia, tudo mudou.

Em 12 de novembro de 1660, ano no qual se havia instituído a nova regra anglicana, Bunyan viajou para o interior para participar de um culto, no qual ele pregaria como convidado. Chegando ao local, encontrou os cristãos reunidos normalmente, mas ele os percebeu visivelmente tensos. Explicaram-lhe que estavam recebendo ameaças de prisão, caso ele pregasse. Tentaram dissuadi-lo de subir ao púlpito, mas ele respondeu:

“Não, de maneira nenhuma, não vou me intimidar, nem vou mandar encerrar a reunião por isso. Venham, tenham bom ânimo; não nos assustemos; nossa causa é boa, não precisamos ter vergonha disso; pregar a Palavra de Deus é uma obra tão boa, que seremos bem recompensados, se sofrermos por isso; ou por esse propósito”. (Bunyan, John. Grace Abounding To The Chief Of Sinners, p. 95. Edição do Kindle).

Bunyan sabia que se recuasse por causa da ameaça de prisão, sua atitude significaria que todos os demais fariam o mesmo quando estivessem sob a mesma pressão. Viu-se, então, na obrigação de permanecer firme e fiel à causa do evangelho. Por outro lado, ele também sabia de suas responsabilidades com esposa e quatro filhos, cada um dos quais com menos de nove anos de idade, sob os seus cuidados. Essa realidade torturava a sua mente, mas ele não via como poderia se recusar a pregar o evangelho simplesmente por medo de ser preso. Então ele resolveu pregar.

Tão logo começou a proferir sua mensagem, alguns homens invadiram a casa de cultos e o levaram preso. Enquanto era levado, Bunyan fazia alusão à primeira carta de Pedro, capítulo 2, destacando que ele não estava sofrendo por qualquer coisa má que tivesse praticado, mas por seguir os passos de Jesus (1 Pedro 2.21).

O jovem Bunyan, contando apenas 32 anos de idade, foi levado perante o magistrado para receber uma reprimenda por ter violado a lei, posto que não tinha licença legal para pregar. Todos esperavam que ele se retratasse e abandonasse a ideia de pregar, mas Bunyan continuou na contramão. Expôs à corte que estava apenas cumprindo aquilo para o que Deus mesmo o havia chamado a fazer; estava apenas exercendo os dons que Deus mesmo tinha dado a ele para pregar o evangelho em benefício de outros cristãos. O juiz perdeu a paciência e garantiu a Bunyan que exterminaria aquelas reuniões. Bunyan respondeu a tudo sem perder a calma. Manteve firme a convicção de jamais deixar de pregar e foi conduzido à prisão de Bedford. Preso, ele refletiu:

“Apesar dessas ajudas (das passagens bíblicas nas quais ele meditava), achava-me um homem cercado de debilidades; a separação de minha esposa e de meus filhos sempre me tem sido como arrancar a carne dos meus ossos, enquanto estou neste lugar. Isso não somente porque amo demais essas grandes misericórdias, mas porque sempre sou lembrado das muitas privações, misérias e da grande falta que minha pobre família provavelmente terá, se eu for tirado deles, especialmente minha pobre filha cega, que está mais perto de meu coração do que qualquer outra coisa. Ah! Pensar nas privações que minha filha cega pode passar quebra o meu coração em pedaços! Pobre criança, pensei, que sofrimento você provavelmente terá como sua porção neste mundo! Você poderá ser esbofeteada, mendigar, passar fome, frio, não ter o que vestir e milhares de outras calamidades, embora eu não possa fazer muito mais que impedir o vento de soprar sobre você. Mas, controlando-me, pensei: devo confiar todos vocês a Deus, mesmo que deixá-los fira-me até ao âmago. Ah, vi que nesta situação, eu era como um homem que derrubava sua casa na cabeça de sua esposa e de seus filhos! Apesar disso, pensei, preciso fazer isso, preciso fazer isso. Então, pensei naquelas duas vacas que carregaram a Arca de Deus para outra terra, deixando seus bezerros para trás (1 Samuel 6.10 a 12)”. Várias considerações me auxiliaram nesta tentação, (uma delas foi a esperança deste versículo) “Deixa os teus órfãos, e eu os guardarei em vida; e as tuas viúvas confiem em mim” (Jeremias 49.11).

(Bunyan, John. Grace Abounding To The Chief Of Sinners, p. 89-90. Edição do Kindle).

Foi nesta esperança que Bunyan se estribou ao longo dos 12 anos que ele permaneceu na prisão, salvo alguns breves períodos de liberdade, até que ele fosse libertado definitivamente em 1675.

Eu me pergunto: Como seria ter 12 anos tirados de minha vida assim dessa maneira? Lembre-se: Bunyan passou 12 na cadeia não porque fosse culpado de roubou ou assassinato, por exemplo. A culpa era por ter pregado o evangelho. Como seria ter 12 anos de minha vida tomados de mim daquele jeito? Como seria para você?

Eu conheço meu próprio coração bem o bastante para supor que talvez eu lutaria com amargura e ansiedade. Especialmente por saber que gente muito pior do que eu estaria em liberdade; pessoas que de fato haviam cometido crimes estariam em liberdade; mas eu, pelo simples fato de ter pregado o evangelho e me recusar a dizer que nunca mais pregaria o evangelho, estava amargando aquela prisão, enquanto minha família era privada de minha presença, provisão e proteção. Inda mais, a qualquer momento eu poderia ser liberto, desde que assumisse o compromisso de não pregar mais o evangelho. Como você se sentiria? De que maneira você empregaria aqueles 12 anos de prisão?

Olhe para Bunyan mais uma vez: após cinco anos livre para pregar, ele foi preso por 12 anos por ter pregado sem a licença do Estado, e por se recusar a parar de pregar. No entanto, aquele puritano abençoou o povo de Deus ainda mais, para muito além de seu contexto e geração. Isto porque, ainda que preso, escreveu um dos livros cristãos mais maravilhosos da história do cristianismo: O Peregrino, que é considerada uma das obras de ficção religiosa e teológica mais significativas da literatura inglesa e mundial; estima-se que ele foi traduzido para mais de 200 idiomas e nunca ficou fora de catálogo.

Pare e pense por um instante. Tome fôlego e reflita. Se Bunyan tivesse dado um jeitinho para não continuar preso, se ele tivesse contornado e agido com meias verdades apenas para se ver liberto da prisão, se ele tivesse dito, apenas proforma, que se comprometia a não mais pregar, se ele tivesse pensado apenas nele mesmo e no sofrimento da família, especialmente nas privações da filha mais velha, Mary, que era cega, certamente ele poderia ter ficado fora da prisão, e teria nos empobrecido grandemente. Sim, pois fora da cadeia, Bunyan provavelmente não teria escrito os clássicos O Peregrino, Guerra Santa, Graça Abundante ao Principal dos Pecadores e outros cinco livros pelo menos (estima-se que ao todo ele tenha escrito nove livros na prisão). Em poucas palavras: a liberdade de Bunyan teria empobrecido a literatura cristã.

Responda-me: Efésios, Filipenses, Colossenses e Filemom, o que essas cartas do Novo Testamento têm em comum? Todas elas foram escritas da prisão. Paulo as escreveu de Roma, durante o seu primeiro período de prisão, aproximadamente entre 60 e 62 d.C. E por que Paulo estava preso? Assim como John Bunyan (ou John Bunyan como ele), o apóstolo estava na prisão por pregar o evangelho. Portanto, se Paulo tivesse optado pela liberdade, tivesse ele pensado apenas a curto prazo ou apenas nele mesmo, o custo não teria sido apenas que ele não poderia sair pregando livremente, mas que também nós jamais teríamos essas Cartas da prisão. Já pensou o Novo Testamento sem Efésios, Filipenses, Colossenses e Filemom? Que desperdício teria sido a liberdade de Paulo! Tome um tempo para ler as Cartas da prisão (Efésios, Filipenses, Colossenses e Filemom) e perceba, por você mesmo, o que o mundo teria perdido se não tivéssemos esses documentos compostos em uma masmorra em Roma.

Pois bem, a pequena carta de Paulo a Filemom tem sido o nosso objeto de estudo já há alguns domingos. Estamos caminhando para a sua conclusão (Deus permitindo), e a primeira lição que eu desejo extrair para nós é que aquelas liberdades que, em Cristo, nós acabamos perdendo, todas elas podem ser revertidas para o nosso bem e o progresso do evangelho. Já pensou sobre isto? Portanto, pare de se amargurar ou de ficar ansioso e olhe para a sua prisão como uma oportunidade para você se preservar, amadurecer e frutificar para a glória de Jesus Cristo, o Filho eterno de Deus.

A carta do perdão

Henrique VIII da Inglaterra (1491-1547) decidiu que anularia seu casamento com Catarina de Aragão para se casar com Ana Bolena na esperança de que a segunda esposa lhe desse um herdeiro. Thomas More (1478-1535) atuava como Senhor Chanceler da Igreja na Inglaterra, uma espécie de Arcebispo. Sendo profundo conhecedor de teologia e do direito canônico, além de homem piedoso, More via na anulação do casamento do rei uma matéria da jurisdição do papado, e a posição do Papa Clemente VII era claramente contra o divórcio em razão da doutrina sobre a indissolubilidade do matrimônio. A opção que sua consciência julgou ser a melhor foi a de deixar o cargo de Senhor Chanceler do rei. O desdobramento deste ato culminou com sua injusta e sumária condenação à morte. Pela sentença o réu era condenado “a ser suspenso pelo pescoço” e cair em terra ainda vivo. Depois seria esquartejado e decapitado. Em atenção à importância do condenado, o rei, “por clemência”, reduziu a pena a “simples decapitação”.

A sua cabeça foi exposta na ponte de Londres durante um mês, e posteriormente recolhida por sua filha, Margaret Roper. A execução de Thomas More na Torre de Londres, no dia 6 de julho de 1535, ordenada por Henrique VIII, foi considerada uma das mais graves e injustas sentenças aplicadas pelo Estado contra um homem de honra, consequência de uma atitude despótica e de vingança pessoal do rei. (Disponível em https://pt.wikipedia.org/wiki/Thomas_More).

As palavras de More aos juízes injustos ficaram famosos na história:

“Como o bem-aventurado apóstolo São Paulo, consentiu com a morte de São Estêvão, e segurou os mantos daqueles que o apedrejaram até a morte, e ainda assim estão os dois santos no céu, e continuarão lá amigos para sempre, então eu realmente confio, e, portanto, orarei com toda a sinceridade, para que, embora Vossas Senhorias tenham agora aqui na terra sido os juízes da minha condenação, ainda possamos, daqui em diante no céu, todos nos encontrar alegremente, para a nossa salvação eterna. (Fonte: MacArthur, p. 225).

Ô, meu povo, a beleza do perdão! A beleza do perdão de Thomas More, valendo-se do exemplo de Estêvão. A beleza do perdão do próprio Estêvão, que disse: “Senhor, não os culpes por este pecado”! Enquanto eles esmagavam seu corpo com pedras brutas (Atos 7.60). A beleza do perdão do Senhor Jesus, que olhou para seus crucificadores e disse: “Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que fazem” (Lucas 23.34). A beleza do perdão conforme está posta nesta nossa pequena carta de Paulo a Filemom.

Embora nunca mencione a palavra “perdão”, a carta nos ensina uma lição viva de perdão. Ela nos ensina alguns elementos essenciais do perdão da maneira mais gentil, prática e sutil possível. É o que nós temos estudado ao longo deste texto. Paulo já nos ajudou a ver que o perdão é possível por causa do amor que nasce do evangelho, por isso que estudamos sobre a importância da comunidade do amor (vs. 1 a 3); a necessidade da influência do amor (vs. 4 a 7); como deve ser a prática do amor (vs. 8 a 18); como se dá a intervenção do amor (vs. 8 a 22) e agora nós aprenderemos sobre as motivações do amor (vs. 17 a25).

Chegamos agora aos versículos finais desta carta, versículos 17 a 25, onde Paulo nos abre uma visão sobre os motivos para o perdão. Em outras palavras: Por que perdoar? Qual é a motivação interna impulsionadora do amor que nos faz pedir perdão ou perdoar? Há neste texto pelo menos cinco motivações para se perdoar:

A visibilidade do evangelho (vs. 17 a 19); a possibilidade de abençoar (v. 20); a necessidade de obediência (v. 21); a importância de se manter comunhão (vs. 22 a 24); a medida da graça que recebemos de Cristo (v. 25).

1 - A visibilidade do evangelho

Filemom havia sido lesado por Onésimo. Para fugir e arcar com suas despesas, o servo deve ter pegado dinheiro ou algum bem do seu senhor. A lei de Moisés dizia expressamente que nesses casos, restituição deveria ser feita, conforme se lê (Números 5.6 a 8 “Diga aos israelitas: Quando um homem ou uma mulher prejudicar outra pessoa e, portanto, ofender ao Senhor, será culpado. Confessará o pecado que cometeu, fará restituição total, acrescentará um quinto a esse valor e entregará tudo isso a quem ele prejudicou. Mas, se o prejudicado não tiver nenhum parente próximo para receber a restituição, está pertencerá ao Senhor e será entregue ao sacerdote, juntamente com o carneiro com o qual se faz propiciação pelo culpado”). Ora, até que Onésimo conseguiria confessar o pecado e pedir o devido perdão, mas pagar indenização com acréscimo de 20% ao valor devido a Filemom, conforme ditava a lei, era impossível para aquele miserável fugitivo.

Daí que Paulo escreveu (vs. 17 a 19 “Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa”).

Meu Deus! Que palavra forte! Paulo estava dizendo a Filemom para tratar Onésimo da mesma forma como ele o trataria. Queria que Onésimo desfrutasse da mesma retidão que o apóstolo aos olhos de Filemom: receba-o como você me receberia, perdoe-o como você me perdoaria, sinta-se obrigado a ele da mesma forma que você se sentiria obrigado a mim, receba-o da mesma forma que você receberia a mim, e se ele te deve, cobre tudo de mim, eu mesmo pagarei a conta por Onésimo.

Você percebeu o que Paulo estava fazendo? Ele estava tornando o evangelho visível. O apóstolo estava desempenhando um papel redentor, salvífico na vida de Filemom e Onésimo. De fato, o mesmo papel que Jesus Cristo desempenha no relacionamento entre o pecador e Deus. Filemom, assim como Deus Pai, foi defraudado. Foi ofendido. Onésimo é como o pecador que fugiu de Deus, que defraudou a Deus, que desperdiçou sua vida no pecado e precisa se reconciliar. Alguém deve pagar o preço, certo? Quem? Jesus Cristo.

Paulo conhecia muito bem a realidade da morte substitutiva de Jesus Cristo. Ele tinha pregado isso por anos, inclusive para Filemom e Onésimo. O que ele estava, então, fazendo era dizer aos dois, especialmente a Filemom: Eu quero ser como Cristo. Quero assumir a dívida e o pecado de Onésimo para que ele se reconcilie com você. Quero tornar o evangelho visível aos olhos de vocês e através da vida de vocês.

Pare e pense. Isso lhe dá algum insight sobre o coração ou as motivações de Paulo? Você se lembra quando ele disse em várias ocasiões: “Sede meus imitadores como eu sou de Cristo”? Aqui você o vê como o substituto para a reconciliação. Muito parecido com Cristo! Nunca somos mais semelhantes a Deus do que quando perdoamos. Nunca somos mais semelhantes a Cristo do que quando carregamos a dívida para que o perdão e a reconciliação possam ocorrer. Paulo estava agindo como Cristo. Ele disse: vou assumir a consequência do pecado de Onésimo; você, Filemom, apenas o receba de volta. Que coisa linda, linda de morrer!

Toda vez que alguém peca contra nós, ficamos com a chance de tornar o evangelho visível: pegamos a dívida, o prejuízo, o que for (mesmo que sejamos nós mesmos os lesados) e levamos conosco tudo para a cruz; entregamos de volta amor, perdão e reconciliação.

Que motivação nós devemos ter para perdoar? A visibilidade do evangelho. Tornar visível em nossa própria vida o que Cristo fez por nós e por todos os pecadores.

2 - A possibilidade de abençoar

O que nos motiva a amar e perdoar é, em primeiro lugar, tornar visível o evangelho na nossa própria vida. Mas tem mais: motiva-nos a amar e a perdoar a possibilidade que temos de abençoar com o nosso amor e perdão. Ouça mais uma vez o que Paulo escreveu a Filemom (v. 20 “Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo).

Paulo sabia que Filemom tinha o dom de abençoar o próximo. No versículo 7 ele já tinha escrito o seguinte: “Seu amor, meu irmão, tem me dado muita alegria e conforto, pois sua bondade tem revigorado o coração do povo santo”. Assim como Filemom por tanto tempo já havia reanimado ou revigorado o coração de tantas pessoas, agora era a vez de Paulo mesmo ser revigorado ou reanimado por ele. Mas como?

O ato de perdão de Filemom alegraria Paulo por demonstrar que seu filho na fé estava crescendo na graça e no conhecimento de nosso Senhor Jesus Cristo.

Quer ver uma coisa?

Você se lembra das palavras de Paulo em Filipenses 2.2, quando ele disse: “completem minha alegria”? De que maneira eles completariam a alegria de Paulo? O versículo continua: “concordando sinceramente uns com os outros, amando-se mutuamente e trabalhando juntos com a mesma forma de pensar e um só propósito”. Em outras palavras, no espírito de Filipenses 2.3 e 4: “Filemom, se você não for egoísta, nem tentar impressionar ninguém, se for humilde e considerar Onésimo mais importante que você, se você não se preocupar apenas com seus próprios interesses, mas preocupar-se também com os interesses de Onésimo e os meus, você me alegrará, reanimará meu coração”.

Por outro lado, caso Filemom se recusasse a perdoar Onésimo, ele levaria pesar ao coração de Paulo, entristeceria o coração do apóstolo. Paulo amava os dois, e amava também a igreja, a unidade da igreja. Logo, qualquer falha em perdoar prejudicaria aquela relação, prejudicaria a igreja. Prejudicaria também a eficácia do ministério de Paulo e o poder do evangelho aos olhos do mundo que os estava observando. Então, o apóstolo simplesmente diz: muito me alegrará se você perdoar, será uma bênção para Onésimo, para você, para a igreja e para mim, será uma bênção para o evangelho.

Que motivos nós temos para amar e perdoar? O amor que promove o perdão torna visível o evangelho e abençoa todos ao redor. Quê mais?

15 - A intervenção do amor - Parte 4

 


 

Filemom 1.8 a 22 “Por isso, mesmo tendo em Cristo plena liberdade para mandar que você cumpra o seu dever, prefiro fazer um apelo com base no amor. Eu, Paulo, já velho, e agora também prisioneiro de Cristo Jesus, apelo em favor de meu filho Onésimo, que gerei enquanto estava preso. Ele antes lhe era inútil, mas agora é útil, tanto para você quanto para mim. Mando-o de volta a você, como se fosse o meu próprio coração. Gostaria de mantê-lo comigo para que me ajudasse em seu lugar enquanto estou preso por causa do evangelho. Mas não quis fazer nada sem a sua permissão, para que qualquer favor que você fizer seja espontâneo, e não forçado. Talvez ele tenha sido separado de você por algum tempo, para que você o tivesse de volta para sempre, não mais como escravo, mas, acima de escravo, como irmão amado. Para mim ele é um irmão muito amado, e ainda mais para você, tanto como pessoa quanto como cristão. Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa. Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês”.

Estratégias de um pacificador

Recapitulando: A carta a Filemom foi escrita por um pacificador. Ela serviu para reconciliar Filemom e Onésimo, contribuiu para que houvesse perdão, comunhão e libertação. Mas tem mais uma coisa: Paulo escreveu este documento de tal modo a nos ensinar a ser o tipo de pacificador que todo cristão é chamado a ser.

Há pelo menos cinco estratégias que podemos observar, estratégias imprescindíveis para se intervir com amor pela causa do amor, para se intervir como pacificador:

1 - Apele com base no amor, não na força da autoridade (vs. 8 e 9);

2 - Apele com base na empatia, não na frieza da distância (v. 10);

3 - Apele com base no sacrifício, não na imposição da servidão (vs. 11 a 14);

4 - Apele com base na transformação do coração, não na mudança do comportamento (vs. 11, 15 e 16);

5 - Apele com base na lógica do evangelho, não na ideia do aqui se faz, aqui se paga (vs. 17 a 22).

As primeiras quatros estratégias já estudamos nas aulas anteriores. Prossigamos com a quinta e última…...

5 – Apele com base na lógica do evangelho, não na ideia do aqui se faz, aqui se paga

Paulo apelou a Filemom com base no amor, não na força da autoridade (vs. 8 e 9); com base na empatia, não na frieza da distância (v. 10); com base no sacrifício, não na imposição da servidão (vs. 11 e 14); com base na transformação do coração, não na mudança do comportamento (vs. 11, 15 e 16). Mas tem uma coisa mais: Paulo apelou com base na lógica do evangelho, não na ideia do aqui se faz, aqui se paga (vs. 17 a 22 “Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa. Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês”).

Que declaração poderosa! As pessoas não costumam tomar assim o lugar de outras pessoas. Você tomaria o lugar de Onésimo? Assumiria a culpa dele? Se ofereceria para pagar as contas dele, mesmo sem ter ouvido o lado de Filemom? Afinal, toda história tem dois lados, não é mesmo? E se Onésimo tivesse mentido? Como Paulo foi capaz de confiar na história de Onésimo? As evidências estavam na nova vida de Onésimo, fruto do evangelho da graça de Deus em Cristo Jesus. E não importava o que um ou outro tivesse feito, quem estava ou não estava com a razão: Onésimo precisava pedir perdão e restituir Filemom de alguma maneira; Filemom, por sua vez, deveria perdoar e receber Onésimo como irmão. Essa é a lógica do evangelho.

A lógica do evangelho é que todos nós temos um débito impossível de ser pago por nós mesmos, mas houve um que veio do céu e se fez carne: “Cristo Jesus, homem” (1 Timóteo 1.5, ARA). Ele viveu sem pecados. Tomou sobre si mesmo os nossos pecados. Morreu na cruz, sob o castigo de Deus, não pelos pecados dele, mas pelos nossos. Foi sepultado e ressuscitou vitorioso. Os que se arrependem e nele creem, têm seus débitos cancelados e recebem perdão e salvação. Paulo escreveu assim, 1 Timóteo 2.5 e 6 “Porquanto há um só Deus e um só Mediador entre Deus e os homens, Cristo Jesus, homem, o qual a si mesmo se deu em resgate por todos: testemunho que se deve prestar em tempos oportunos” (ARA).

Eis a lógica do evangelho: aquele que não tinha pecado, que não tinha qualquer dívida a pagar, tomou sobre si mesmo os nossos pecados e pagou por eles em nosso lugar. Paulo provou desse evangelho, aprendeu essa lógica e, portanto, foi capaz de dizer a Filemom (vs. 17 a 19 “Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa”).

A lógica de Paulo é a lógica do evangelho, a lógica do substituto de Deus no lugar do pecador: Cristo Jesus, homem. Justiça, verdadeiramente, se faz com a lógica do evangelho, não com a lógica do aqui se faz, aqui se paga. Não há como nós mesmos pagarmos pelos nossos débitos. Ninguém será capaz de pagar a você os débitos devidos a você. Somente Cristo, e ele já pagou lá na cruz, quando tomou, em nosso lugar, a morte e a condenação que nos eram devidos.

Quem provou desse amor que nasce do evangelho de Cristo aprende a viver por essa lógica do evangelho de Cristo, e aprende a perdoar. A lógica do evangelho não é “aqui se faz, aqui se paga”, mas antes “nós pecamos contra Deus e contra o próximo, e Cristo morreu em nosso lugar para pagar a dívida que era nossa”. Esse amor e essa lógica do evangelho nos fazem acreditar que as pessoas podem sim mudar e florescer.

A esperança de que todo mundo, toda e qualquer pessoa pode mudar e florescer por causa do evangelho e pela lógica do evangelho foi o que motivou Paulo a escrever (vs. 20 a 22 “Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês”).

É isto o que o evangelho de Jesus Cristo nos proporciona: a possibilidade de se ver perdão nascer, gentileza florescer, pessoas nos reanimar, obediência ser praticada e muito mais do que pedimos ou pensamos ser realizado pelo poder de Deus que opera em nós. Sem contar que o evangelho nos proporciona sempre um cantinho no coração e no quarto da casa de irmãos amados. Ah, como eu amo esses versículos! Ouça, mais uma vez, povo de Deus, ouça: (vs. 20 a 22 “Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês”).

A intervenção do amor

O nosso texto nos mostrou que Paulo interviu com amor na vida de Filemom. O apóstolo agiu como pacificador. Essa intervenção amorosa nos ensina como nós devemos intervir em amor para ajudar uns aos outros no contexto da igreja local, ou seja, como nós podemos agir enquanto pacificadores.

Quais são os apelos feitos pela intervenção do amor?

Como vimos, Paulo apelou a Filemom com base:

1 - No amor, não na força da autoridade (vs. 8 e 9);

2 - Na empatia, não na frieza da distância (v. 10);

3 - No sacrifício, não na imposição da servidão (vs. 11 a 14);

4 - Na transformação do coração, não na mudança do comportamento (vs. 11, 15 e 16);

5 - Na lógica do evangelho, não na ideia do aqui se faz, aqui se paga (vs. 17 a 22).

Permita-me duas perguntas para algumas aplicações finais: O que se pode aprender para a nossa prática de fazer discípulos e aconselhar uns aos outros? O que se pode aprender para a busca e a manutenção da justiça social?

Para se fazer discípulos ou aconselhar o irmão, precisaremos:

Agir com base no amor, não na autoridade;

Ser empáticos, não distantes;

Praticar sacrifícios de amor, não impor servidão ou vontade própria;

Mirar no coração, não no comportamento;

Viver e ensinar a lógica do evangelho, não a ideia de que aqui se faz, aqui se paga.

Para se buscar e manter a justiça social, precisaremos:

Viver de forma a demonstrar que nosso chamado é para amar (mesmo que no exercício da autoridade), e não impor uma vontade;

Viver de forma empática, simpática, e não como crentes frios, distante e rabugentos;

Demonstrar que existimos para servir, não para ser servidos; atitude que inclui a todos, tanto o opressor como o oprimido, tanto a vítima como o réu;

Buscar a transformação do coração das pessoas pelo evangelho, não a imposição goela abaixo dos valores cristãos evangélicos;

Viver e espalhar a lógica do evangelho, não a ideia de que aqui se faz, aqui se paga.

A intervenção do amor pautado pelo evangelho de Cristo é a única esperança para a sua vida, a família e a nossa sociedade. Abra seu coração para o amor de Jesus. Faça as pazes com Deus por meio de Jesus Cristo. Seja um pacificador em nome de Jesus Cristo.

Quatro dicas de como intervir com amor

Permita-me encerrar apresentando quatro dicas práticas de como intervir com amor, especialmente no que diz respeito a resolver conflitos e curar relacionamentos, nossos e dos outros. Baseamo-nos, a seguir, na introdução de Ken Sande em seu livro O Pacificador (Sande, p. 12 e 13).

1 - Glorifique a Deus (1 Coríntios 10.31 “Assim, quer vocês comam, bebam ou façam qualquer outra coisa, façam tudo para a glória de Deus”).

A intervenção do amor é motivada e guiada por um profundo desejo de promover honra e levar glória a Deus, revelando o amor e o poder reconciliadores de Jesus Cristo. À medida que recorremos à sua graça, seguimos seu exemplo e colocamos em prática seus ensinamentos, encontraremos liberdade das decisões impulsivas e egocêntricas que contaminam nossas atitudes e elevaremos louvor a Deus, demonstrando o poder do evangelho em nosso viver.

2 - Tire o tronco do seu olho (Mateus 7.5 “Hipócrita, tire primeiro a viga do seu olho, e então você verá claramente para tirar o cisco do olho do seu irmão”).

Atacar os outros apenas estimula contra-ataques. É por isso que Jesus nos ensina a encarar nossas próprias faltas em um conflito antes de nos concentrarmos no que os outros fizeram. Quando negligenciamos as ofensas menores de outras pessoas e admitimos honestamente nossos próprios defeitos, nossos oponentes geralmente respondem da mesma maneira. À medida que as tensões diminuem, pode-se abrir caminho para uma discussão, negociação e reconciliação sinceras.

3 - Restaure delicadamente (Gálatas 6.1 “Irmãos, se alguém for surpreendido em algum pecado, vocês, que são espirituais deverão restaurá-lo com mansidão. Cuide-se, porém, cada um para que também não seja tentado”).

Quando outras pessoas não conseguem ver suas próprias faltas em um conflito, às vezes precisaremos agir para lhes mostrar graciosamente a culpa delas mesmas. Se essas pessoas se recusarem a responder adequadamente, Jesus nos chama a envolver amigos respeitados, líderes da igreja ou outras pessoas pontuais que poderão nos ajudar a incentivar o arrependimento e restaurar a paz.

4 - Vá e se reconcilie (Mateus 5.23 e 24 “Portanto, se você estiver apresentando sua oferta diante do altar e ali se lembrar de que seu irmão tem algo contra você, deixe sua oferta ali, diante do altar, e vá primeiro reconciliar-se com seu irmão; depois volte e apresente sua oferta”).

Finalmente, a manutenção da paz ou a intervenção do amor envolve um compromisso de restaurar relacionamentos prejudicados e negociar acordos justos. Quando perdoamos os outros como Jesus nos perdoou e buscamos soluções que satisfaçam os interesses dos outros e os nossos, os detritos do conflito são eliminados e a porta é aberta para uma paz genuína.

Que Deus nos abençoe com graça, misericórdia e paz na importante tarefa de sermos pacificadores neste mundo em erupção de ira, expelindo lavas de ódio em todos os lugares.

Somos chamados à paz.

14 - A intervenção do amor - Parte 3

 


 

Filemom 1.8 a 22 “Por isso, mesmo tendo em Cristo plena liberdade para mandar que você cumpra o seu dever, prefiro fazer um apelo com base no amor. Eu, Paulo, já velho, e agora também prisioneiro de Cristo Jesus, apelo em favor de meu filho Onésimo, que gerei enquanto estava preso. Ele antes lhe era inútil, mas agora é útil, tanto para você quanto para mim. Mando-o de volta a você, como se fosse o meu próprio coração. Gostaria de mantê-lo comigo para que me ajudasse em seu lugar enquanto estou preso por causa do evangelho. Mas não quis fazer nada sem a sua permissão, para que qualquer favor que você fizer seja espontâneo, e não forçado. Talvez ele tenha sido separado de você por algum tempo, para que você o tivesse de volta para sempre, não mais como escravo, mas, acima de escravo, como irmão amado. Para mim ele é um irmão muito amado, e ainda mais para você, tanto como pessoa quanto como cristão. Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa. Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês”.

Estratégias de um pacificador

Recapitulando: A carta a Filemom foi escrita por um pacificador. Ela serviu para reconciliar Filemom e Onésimo, contribuiu para que houvesse perdão, comunhão e libertação. Mas tem mais uma coisa: Paulo escreveu este documento de tal modo a nos ensinar a ser o tipo de pacificador que todo cristão é chamado a ser.

Há pelo menos cinco estratégias que podemos observar, estratégias imprescindíveis para se intervir com amor pela causa do amor, para se intervir como pacificador:

1 - Apele com base no amor, não na força da autoridade (vs. 8 e 9);

2 - Apele com base na empatia, não na frieza da distância (v. 10);

3 - Apele com base no sacrifício, não na imposição da servidão (vs. 11 a 14);

4 - Apele com base na transformação do coração, não na mudança do comportamento (vs. 11, 15 e 16);

5 - Apele com base na lógica do evangelho, não na ideia do aqui se faz, aqui se paga (vs. 17 a 22).

As primeiras três estratégias já estudamos nas aulas anteriores. Prossigamos com mais uma…...

4 - Apele com base na transformação do coração, não na mudança do comportamento (vs. 11 a 16 “Ele antes lhe era inútil, mas agora é útil, tanto para você quanto para mim. Mando-o de volta a você, como se fosse o meu próprio coração. Gostaria de mantê-lo comigo para que me ajudasse em seu lugar enquanto estou preso por causa do evangelho. Mas não quis fazer nada sem a sua permissão, para que qualquer favor que você fizer seja espontâneo, e não forçado. Talvez ele tenha sido separado de você por algum tempo, para que você o tivesse de volta para sempre, não mais como escravo, mas, acima de escravo, como irmão amado. Para mim ele é um irmão muito amado, e ainda mais para você, tanto como pessoa quanto como cristão”).

Paulo traz à lembrança de Filemom um fato do passado de Onésimo: “ele não lhe foi de muita utilidade”; literalmente: “ele lhe foi inútil no passado”; ao mesmo tempo, o apóstolo testemunha a respeito do poder do amor do evangelho para transformar pessoas inúteis em muito úteis para todo mundo. Com efeito, é impressionante como o evangelho é capaz de pegar uma vida desperdiçada e transformá-la em alguma coisa de incomparável e inestimável valor. Isto é o que nós testemunhamos no versículo 11 “Onésimo não lhe foi de muita utilidade no passado, mas agora é muito útil para nós dois”.

Não apenas isto, o evangelho é poderoso para restaurar relacionamentos que um dia foram quebrados por causa do pecado. É disso que Paulo está falando com Filemom “Veja, Filemom, você precisou perder Onésimo para ele ser achado por Cristo. E agora ele não é mais aquele a quem você e sua família costumavam se referir como inútil. Agora, em Cristo, ele foi transformado. Ele é útil para nós dois. Ele não é mais um escravo para você. É um irmão amado. E será, ouça bem Filemom, alguém muito importante para você, de fato, uma bênção como pessoa e como irmão no Senhor”. (Vs. 15 e 16)

Realmente, o evangelho tem poder para restaurar vidas desperdiçadas e relacionamentos destruídos. É preciso, porém, que se foque no coração, reconheça-se os pecados, confesse-os a Deus e se clame pela graça de Jesus com arrependimento e fé.

Quantos de nós poderíamos dar testemunho do poder do evangelho que restaurou nossa vida desperdiçada, além de ter restaurado alguns relacionamentos destruídos.

(Fale de você, da sua mudança de vida, suas transformações…)

O evangelho de Jesus Cristo é poderoso para regenerar o coração depravado, redimir uma vida desperdiçada e restaurar relacionamentos destruídos. Prove e veja! Arrependa do pecado e creia em Cristo.

O que verdadeiramente transforma um indivíduo não é algum programa de reabilitação, por mais valiosos que alguns deles sejam, onde gradualmente alguém vai sendo mudado no nível do comportamento; o que muda realmente alguém, de dentro para fora, do coração ao comportamento é o milagre da regeneração, do novo nascimento, é a conversão a Jesus Cristo. Prove e veja. Arrependa-se e creia em Cristo Jesus. Você será salvo da condenação eterna, desfrutará de comunhão com Deus, sua vida será útil, verdadeiramente útil; e você poderá contar com irmãos amados para trilhar ao seu lado no caminho apertado que é a vida cristã.

De volta a Filemom: esta carta é um testemunho vivo do poder do evangelho para transformar tanto o opressor como o oprimido na busca pela justiça social. Veja, mais uma vez:

Filemom 1.11 a 16 “Ele antes lhe era inútil, mas agora é útil, tanto para você quanto para mim. Mando-o de volta a você, como se fosse o meu próprio coração. Gostaria de mantê-lo comigo para que me ajudasse em seu lugar enquanto estou preso por causa do evangelho. Mas não quis fazer nada sem a sua permissão, para que qualquer favor que você fizer seja espontâneo, e não forçado. Talvez ele tenha sido separado de você por algum tempo, para que você o tivesse de volta para sempre, não mais como escravo, mas, acima de escravo, como irmão amado. Para mim ele é um irmão muito amado, e ainda mais para você, tanto como pessoa quanto como cristão”.

Louvado seja Deus pelo evangelho de Jesus Cristo!

13 - A intervenção do amor - Parte 2

 


 

Filemom 1.8 a 22 “Por isso, mesmo tendo em Cristo plena liberdade para mandar que você cumpra o seu dever, prefiro fazer um apelo com base no amor. Eu, Paulo, já velho, e agora também prisioneiro de Cristo Jesus, apelo em favor de meu filho Onésimo, que gerei enquanto estava preso. Ele antes lhe era inútil, mas agora é útil, tanto para você quanto para mim. Mando-o de volta a você, como se fosse o meu próprio coração. Gostaria de mantê-lo comigo para que me ajudasse em seu lugar enquanto estou preso por causa do evangelho. Mas não quis fazer nada sem a sua permissão, para que qualquer favor que você fizer seja espontâneo, e não forçado. Talvez ele tenha sido separado de você por algum tempo, para que você o tivesse de volta para sempre, não mais como escravo, mas, acima de escravo, como irmão amado. Para mim ele é um irmão muito amado, e ainda mais para você, tanto como pessoa quanto como cristão. Assim, se você me considera companheiro na fé, receba-o como se estivesse recebendo a mim. Se ele o prejudicou em algo ou lhe deve alguma coisa, ponha na minha conta. Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei, para não dizer que você me deve a sua própria pessoa. Sim, irmão, eu gostaria de receber de você algum benefício por estarmos no Senhor. Reanime o meu coração em Cristo! Escrevo-lhe certo de que você me obedecerá, sabendo que fará ainda mais do lhe que peço. Além disso, prepare-me um aposento, porque, graças às suas orações, espero poder ser restituído a vocês”.

Onde estão os pacificadores?

Onde estão os pacificadores? Nós precisamos deles. Os pacificadores atuam para a construção de seres humanos fortes e corajosos. Eles são cheios de fé, esperança e amor. Você se habilita a ser um pacificador? Os cristãos são chamados a ser pacificadores. A disposição de ser e de atuar como pacificadores neste mundo em guerra comprova se de fato somos filhos de Deus.

Estratégias de um pacificador

A carta a Filemom foi escrita por um pacificador. Ela serviu para reconciliar Filemom e Onésimo, e contribuiu para que houvesse perdão, comunhão e libertação. Mas tem mais uma coisa: Paulo escreveu este documento de tal modo a nos ensinar a ser o tipo de pacificador que todo cristão precisa ser.

Há pelo menos cinco estratégias que podemos observar, estratégias imprescindíveis para se intervir com amor pela causa do amor, para se intervir como pacificador:

1 - Apele com base no amor, não na força da autoridade (vs. 8 e 9);

2 - Apele com base na empatia, não na frieza da distância (v. 10);

3 - Apele com base no sacrifício, não na imposição da servidão (vs. 11 a 14);

4 - Apele com base na transformação do coração, não na mudança do comportamento (vs. 11, 15 e 16);

5 - Apele com base na lógica do evangelho, não na ideia do aqui se faz, aqui se paga (vs. 17 a 22).

A primeira estratégia nós estudamos na aula anterior. Prossigamos com mais duas…...

2 - Apele com base na empatia, não na frieza da distância (v. 10 “apelo em favor de meu filho Onésimo, que gerei enquanto estava preso”).

Note como Paulo se identificou com Onésimo: ele o fez de forma tão próxima quanto um pai a um filho, “suplico… tornei-me pai dele…” Escrevendo aos tessalonicenses, o apóstolo explicou o significado desse relacionamento pai e filho espirituais (1 Tessalonicenses 2.11 e 12 “Pois vocês sabem que tratamos cada um como um pai trata seus filhos, exortando, consolando e dando testemunho, para que vocês vivam de maneira digna de Deus, que os chamou para o seu Reino e glória”).

Pois foi assim que Paulo se aproximou e conviveu com Onésimo. E agora ele apela com base na empatia para que Filemom fizesse de igual forma (Filemom 10): “Suplico (grego parakaleo: chamar para o meu lado) que demonstre bondade a meu filho Onésimo. Tornei-me pai dele na fé quando estava aqui na prisão”. Trocando em miúdos: Paulo se colocou como pai de dois irmãos que estavam separados pela discórdia; ele chamou cada um para o seu lado, em momentos diferentes, ele os aconselhou, incentivou e insistiu cada um deles “com base no amor”, e depois os colocou cara a cara.

A mesma afeição, carinho e amor que Paulo e Filemom passaram a nutrir um pelo outro, a partir do momento em que Paulo havia se tornado pai de Filemom na fé (v. 19), o apóstolo agora revela nutrir de igual modo por Onésimo (e Onésimo por ele, seu pai na fé). Mais uma vez o versículo 10 “Suplico que demonstre bondade a meu filho Onésimo. Tornei-me pai dele na fé quando estava aqui na prisão”. “Filemom, lembre-se: eu estou te enviando o meu filho, o meu filho Onésimo”!

Meu povo, vocês conseguem ouvir a empatia por traz dessas palavras do apóstolo Paulo?

Paulo sabia o tamanho do amor e do carinho que Filemom nutria por ele (o apóstolo), ao mesmo tempo que imaginava o tamanho da mágoa que o mesmo (Filemom) carregava no coração contra Onésimo. Então ele pensou em uma estratégia: “A única maneira de colocar esses dois de alguma forma juntos de novo, para eles resolverem as diferenças, será trazer cada um deles para perto do meu coração. O meu coração, o meu amor por cada um deles (e o deles por mim) será o ponto de contato dos dois”! Daí: “Filemom, você sabe que eu te amo e eu sei que você me ama. E eu sei que será muito difícil para você amar Onésimo, sobretudo depois de tudo o que ele fez contra você. Mas eu sei também que será mais fácil para você começar a amar Onésimo se souber o quanto eu o amo no Senhor Cristo”. Paulo estava apelando com base na empatia, não na frieza da distância.

A frieza da distância diria algo do tipo: “Filemom, você tem que perdoar e pronto. Você é crente e os crentes perdoam. Portanto, perdoe Onésimo e ponto final”. A empatia, por sua vez, afirma (vs. 9 e 10 “prefiro fazer um apelo com base no amor. Eu, Paulo, já velho, e agora também prisioneiro de Cristo Jesus, apelo em favor de meu filho Onésimo, que gerei enquanto estava preso”). Esse é o tipo de empatia que será capaz de construir pontes entre abismos que separam pessoas que se feriram e depois cada uma seguiu o seu caminho para bem longe uma da outra; ou pessoas que um dia se amaram, mas agora se odeiam por algum motivo; ou pessoas que simplesmente não vão uma com a cara da outra; ou ainda pessoas que simplesmente preferem manter distância uma da outra.

Algumas pessoas costumam dizer que familiaridade ou intimidade estraga os relacionamentos. Você é do tipo que pensa assim? “Familiaridade ou intimidade estraga os relacionamentos”! Em alguns casos isso é verdade. As pessoas começam a viver tão juntas, sem qualquer limite e, principalmente, sem a liga do amor bíblico, que quando elas começam a enxergar os defeitos umas das outras elas se decepcionam e se separam. Mas na família cristã, entre o povo de Deus isso não pode e não deve ser verdade. Familiaridade ou intimidade com fé, esperança e amor é o desejável para que haja amizades perfeitas, casamentos perfeitos, famílias perfeitas e um mundo perfeito. De fato, é a frieza da distância que estraga os relacionamentos. Afinal, a ausência de amor e de gentileza que a proximidade promovida pelo evangelho é capaz de produzir entre as pessoas que vivem em comunhão é o único solvente capaz de dissolver qualquer rusga, má impressão, ideia equivocada ou preconcepção negativa que geralmente nós nutrimos por aquelas pessoas mais distantes da gente e que vemos falar ou agir de alguma forma que não gostamos.

Você já teve a experiência de julgar alguém apenas pela primeira ou pelas primeiras impressões? Pois bem, depois de relutar por um tempo, você resolveu se aproximar. Aos poucos passou a gostar da pessoa. E quando se deu conta, aqueles “defeitos” já não te perturbavam ou te escandalizavam mais. Por quê? Porque agora você colocou amor naquele relacionamento. E mesmo se os defeitos da pessoa ainda te incomodam, eles agora não te afastam dela. Pelo contrário, você se motiva a, em amor, tentar ajudá-la a mudar. Não é assim? Deve ser assim, principalmente na igreja de Cristo. Apelamos com base na empatia, não na frieza da distância. A empatia que une as pessoas em amor é a única forma de se dissipar a aversão, o ressentimento, a raiva ou mesmo o ódio que tantas vezes nós, carnalmente, sentimos pelas pessoas. Portanto, tente se aproximar. Se você não conseguir, aproxime-se de alguém que você ama e que ao mesmo tempo ame a pessoa que você não consegue amar. A empatia do amigo por aquele outro ajudará você a ter simpatia e, eventualmente, amar. Experimente.

Algum tempo atrás, um instituto de pesquisa publicou os resultados de um estudo nos Estados Unidos sobre amizade e o número de amigos que um americano comum costuma ter. Os números são preocupantes: para cada 100 amigos, um afrodescendente americano só possui 8 amigos brancos (e nenhum amigo asiático) e para cada 100 amigos, um americano branco só possui um amigo afrodescendente! (collabra.org). Essa enorme distância racial em uma mesma nação é desastrosa, como nós temos testemunhado ao longo dos anos, especialmente em meses recentes nos Estados Unidos. Mas essas coisas acontecem também aqui no Brasil, entre nós mesmos e até na igreja. E não pensem que eu estou falando apenas de raça ou de cor da pele. Tantas vezes alguém não se aproxima do outro simplesmente porque não foi com a cara dele ou dela.

Há certos tipos de pessoas que geralmente nós simplesmente optamos por não nos aproximarmos. Mantemos distância. E falamos em amor! Ô, meu povo! Nós precisamos nos aproximar, sobretudo na igreja. O amor de Cristo nos uniu e com ele nós mantemos comunhão uns com os outros no seu corpo que é a igreja. Com efeito, como Paulo escreveu aos efésios, Cristo nos “reconciliou com Deus em um só corpo por meio de sua morte na cruz, eliminando a inimizade que havia entre” nós (Efésios 2.16). Nossa salvação, portanto, requer de nós empatia uns pelos outros, não a frieza da distância.

Você poderá perguntar: Como assim, empatia? Deixe-me tentar te ajudar: empatia é a capacidade de compreender emocionalmente alguém; capacidade de projetar a pessoa de Cristo no outro; capacidade de se identificar com outra pessoa em Cristo. Ah, minha gente, e se temos apenas Cristo em comum com o outro, temos tudo o que de fato precisamos para manter comunhão. Mas se Cristo não é o que temos em comum, não interessa o quanto tenhamos de outras coisas mais em comum. Cristo é tudo. Cristo é o que importa.

Aprendemos com Paulo que justiça é o amor restaurando o amor ao seu devido equilíbrio; e que justiça requer empatia, não distância (não se pode julgar alguém à distância, sem alguma empatia). Justiça, com efeito, não é uma mulher com olhos vendados (representando a imparcialidade da justiça), tendo em uma das mãos uma espada (representando força, poder e coragem para impor o direito) e na outra mão a balança com os pratos nivelados (representando o nivelar do tratamento jurídico de todos por igual).

Uma curiosidade: a Justiça do Brasil, escultura localizada em frente ao prédio do Supremo Tribunal Federal em Brasília, não traz a balança. A escultura brasiliense tem os olhos vendados, mas diferentemente das representações usuais da Justiça em pé, a nossa está sentada num banco com a espada no colo, em vez de ter o conjunto espada e balança ou somente balança. Essa representação foi interpretada como símbolo de uma justiça morosa, lenta, posto que está sentada com a espada no colo. Outra interpretação é a de uma justiça que acabou de cumprir seu papel e se assentou. Mas cadê a balança representando o nivelamento do tratamento jurídico de todos por igual? É algo para se pensar. Mas este não é o nosso tópico.

Nosso assunto é que a justiça não é uma mulher em pé, com olhos vendados, portando um conjunto de espada e balança ou somente balança. Justiça é a imagem de um cristão com olhos bem abertos, coração cheio de amor e de empatia pelo seu próximo, Bíblia em uma das mãos, enquanto a outra mão está estendida para ajudar, socorrer ou acolher os que sofrem injustiça. Por isso, o cristão apela com base na empatia, não na frieza da distância. Aproxime-se e ame primeiro, depois aja para ajudar.

3 - Apele com base no sacrifício, não na imposição da servidão (Vs. 11 a 14 “Ele antes lhe era inútil, mas agora é útil, tanto para você quanto para mim. Mando-o de volta a você, como se fosse o meu próprio coração. Gostaria de mantê-lo comigo para que me ajudasse em seu lugar enquanto estou preso por causa do evangelho. Mas não quis fazer nada sem a sua permissão, para que qualquer favor que você fizer seja espontâneo, e não forçado”).

É possível que se leia essa carta e não se leve em consideração o sacrifício envolvido para cada uma das três partes envolvidas no conflito, Paulo, Filemom e Onésimo.

Paulo sacrificaria o convívio com alguém que ele tinha aprendido a amar e lhe estava sendo muito útil (vs. 11-12); e mais, enviaria Onésimo a uma situação muito perigosa, como nós já destacamos em mensagem anterior. O apóstolo deveria sacrificar seu convívio com alguém que ele amava para ensinar que só o amor cristão estabelecesse a justiça.

Filemom, por sua vez, sacrificaria sua reputação e posição social (não punindo Onésimo como era estabelecido pela lei romana), sacrificaria um bem material (escravos eram propriedades valiosas), sacrificaria o valor que ele poderia receber como restituição da parte de Onésimo (algum pagamento pelo que Onésimo roubou e pelos dias não trabalhados), sacrificaria sua subsistência (pois, como ele conseguiria manter escravos depois dessa experiência de perdão e libertação de Onésimo) e sacrificaria seus privilégios (posto que não mais trataria Onésimo como escravo que o servia, mas como irmão que deveria ser servido por ele, Filemom). Filemom deveria se sacrificar para que o amor fizesse justiça.

Da perspectiva dos oprimidos, alguns poderão dizer de forma fria, sem empatia: “Ora, essas coisas Filemom deveria realmente perder ou sacrificar! Aquelas não eram perdas coisas nenhuma! Era dever. Não passava de obrigação”. Mas, para sermos justos, devemos olhar sim para o caso de Filemom com base no amor, não na força da autoridade; com base na empatia, não na frieza da distância; e com base no sacrifício, não na imposição da servidão. Filemom, a bem da verdade, tendo sido criado e ensinado em um contexto de injustiça, não havia ainda aprendido o que de fato é justiça. Foi apenas com sua nova vida em Cristo que ele aprendeu que “justiça é o amor corrigindo aquilo que se revolta contra o amor”, para usarmos as palavras de Martin Luther King Jr. Foi em Cristo, pelo ensino de Paulo, que Filemom aprendeu que a justiça é o amor restaurando o amor ao seu devido equilíbrio, e isso requeria sacrifício de sua parte. O amor colocaria Onésimo em liberdade. Esse era o sacrifício de Filemom: perdoar e abrir mão de Onésimo.

Onésimo, o personagem mais silencioso desse drama pintado pelo apóstolo Paulo, sacrificaria talvez mais do que todo mundo, submeter-se-ia a um grande risco de perder a liberdade definitivamente ou mesmo a própria vida. Mas era o preço que ele deveria pagar, era o sacrifício que ele deveria fazer para ver o amor (pregado por Paulo e praticado por Filemom) produzir justiça. Vamos tentar entender isso com uma ilustração.

Coloque-se no lugar de Onésimo. Você roubou e fugiu das cadeias de seu senhor. Teve sorte o bastante de não ter sido achado e devolvido ao seu dono. Encontra-se com ninguém menos do que Paulo. Ouve-o pregar. Crê no evangelho dele e experimenta uma nova vida, um novo sentimento de paz e de liberdade no coração. Você começa a servir Paulo. Auxilia-o na prisão. O vê escrevendo cartas às igrejas e aprende uma nova forma de enxergar a vida. Um dia, Paulo vira para você e diz que precisa do seu favor.

— Claro, Paulo, qualquer coisa! Você responde a ele. Paulo te diz que acabara de escrever uma carta que precisa ser entregue com urgência a alguém.

— Claro, eu entrego! Aonde? A quem? Você responde.

— Eu quero que você a entregue a Filemom. Diz o apóstolo.

Você acha que não ouviu bem ou não entendeu o que Paulo acabou de dizer e lhe pergunta:

— Qual Filemom?

O apóstolo explica:

— O Filemom que nós dois temos em comum, nosso irmão em Cristo! Aquele que é o seu senhor aqui na terra. Eu estou escrevendo a ele para pedir que te perdoe e te dê sua liberdade; que te receba não mais como um escravo, mas como irmão. E que lhe permita labutar pela causa do evangelho de Cristo. Pegue esta carta e entregue-a a Filemom, por favor”.

Imagine!

É aqui que nós descobrimos que Onésimo, de fato, era um crente. Sabe por quê? Se Paulo escrevesse uma carta como essa e a entregasse ao Leandro, por exemplo: “Leandro, leve, por favor, esta carta a Filemom”. O Leandro certamente teria grande dificuldade de atender ao pedido do apóstolo! E você? Seja honesto! Muito difícil, não é verdade? Mas a justiça que nasce do amor não requer sacrifício apenas da pessoa que está no poder e o esteja exercendo de forma opressora e injusta. A justiça que nasce do amor de Cristo também requer sacrifício e ação amorosa por parte do oprimido ou injustiçado. Não existe a menor possibilidade de se estabelecer ou de se ver a aplicação da justiça sem que todos, absolutamente todos paguem algum preço ou se sacrifiquem de alguma maneira, do grande ao pequeno, do justo ao injusto, do opressor ao oprimido, do pacificador aos que estão sendo pacificados.

Assim foi que Onésimo pegou a carta da mão de Paulo e a levou ao seu ex senhor, Filemom, ao mesmo tempo que se apresentou a ele de volta. Mas note: essa atitude de Onésimo não foi de servidão, tampouco resultado de um ato de coerção da parte de Paulo, mas um ato de amor sacrificial, livremente praticado como a devida reação de todos aqueles que se convertem a Cristo. Sabemos que Paulo jamais teria obrigado ou coagido Onésimo. Por quê? Por causa das palavras que ele mesmo usou em relação a Filemom. (v. 14 “Mas não quis fazer nada sem a sua permissão, para que qualquer favor que você fizer seja espontâneo, e não forçado”).

Ora, se era consentimento de coração e boa vontade em forma de atitudes amorosas que Paulo esperava de Filemom para perdoar e libertar Onésimo, certamente essas mesmas virtudes ele esperava de Onésimo para levar a carta e se apresentar a Filemom. Não é mesmo? Certamente, posto que toda e qualquer atitude cristã sempre terá base no sacrifício de amor, não na imposição da servidão. Assim, as mesmas palavras escritas a Filemom serviam, de igual forma, para Onésimo (v. 14).

A justiça que nasce da força ou da espada da lei, a justiça que nasce da coerção ou como servidão tem vida curta. A experiência comprova que se de alguma forma não houver alguma mudança no coração, a mera justiça imposta a alguém não prevenirá que o sujeito logo volte a praticar a injustiça. Por outro lado, atos de sacrifício em amor produzirão transformações duradouras, se não permanentes.

A lei não transforma ninguém, apenas o evangelho de Cristo é capaz de transformar para melhor o ser humano. Cadeia em si não reabilita ninguém, apenas garante por um tempo (enquanto durar a prisão) a injustiça. Agora, aqueles que saem da cadeia e não voltam a praticar atos de injustiça, assim procedem não por causa da cadeia ou do cumprimento da pena em si, mas antes por causa de algo que mudou lá no seu coração (seja a conversão a Cristo ou alguma mudança de pensamento ou da forma de enxergar a vida na prisão).

Não é a servidão imposta de alguma forma, mas atos de sacrifício em amor que transformará o mundo verdadeiramente. Foi por isso que Paulo apelou a Filemom com base no amor, na empatia e no sacrifício. Mas tem mais…