Sua
conversão:
A
perseguição em Jerusalém na realidade espalhou a semente da fé. Os crentes se
dispersaram e em breve a nova fé estava sendo pregada por toda a parte, Atos
8.4 “Mas os que andavam dispersos iam por toda a parte, anunciando a palavra”.
“Respirando ainda ameaças e morte contra os discípulos do Senhor” (Atos 9.1),
Saulo resolveu que já era tempo de levar a campanha a algumas das “cidades
estrangeiras” nas quais se abrigaram os discípulos dispersos. O comprido braço
do sinédrio podia alcançar a mais longínqua sinagoga do império em questões de
religião. Nesse tempo, os seguidores de Cristo ainda eram considerados como
seita herética. Assim, Saulo partiu para Damasco, cerca de 240 km distante,
provido de credenciais que lhe dariam autoridade para, encontrando os “que eram
do caminho, assim homens como mulheres, os levasse presos para Jerusalém” (Atos
9.2). Que é que se passava na mente de Saulo durante a viagem, dia após dia, no
pó da estrada e sob o calor escaldante do sol? A auto-revelação intensamente
pessoal de Romanos 7.7 a 13 pode dar-nos uma pista “Que diremos pois? É a lei
pecado? De modo nenhum. Mas eu não conheci o pecado senão pela lei; porque eu
não conheceria a concupiscência, se a lei não dissesse: Não cobiçarás. Mas o
pecado, tomando ocasião pelo mandamento, operou em mim toda a concupiscência;
porquanto sem a lei estava morto o pecado. E eu, nalgum tempo, vivia sem lei,
mas, vindo o mandamento, reviveu o pecado, e eu morri.
E o mandamento que era
para vida, achei eu que me era para morte. Porque o pecado, tomando ocasião
pelo mandamento, me enganou, e por ele me matou. E assim a lei é santa, e o
mandamento santo, justo e bom. Logo tornou-se-me o bom em morte? De modo
nenhum; mas o pecado, para que se mostrasse pecado, operou em mim a morte pelo
bem; a fim de que pelo mandamento o pecado se fizesse excessivamente maligno”.
Vemos aqui a luta de um homem consciencioso para encontrar paz mediante a
observância de todas as pormenorizadas ramificações da lei. Isso o libertou? A
resposta de Paulo, baseada em sua experiência, foi negativa. Pelo contrário,
tornou-se um peso e uma tensão intoleráveis. A influência do ambiente helenísticos
de Tarso não deve ser menosprezada ao tentarmos encontrar o motivo da
frustração interior de Saulo. Depois de seu retorno a Jerusalém, ele deve ter
achado irritante o rígido farisaísmo, muito embora professasse aceitá-lo de
todo o coração. Ele havia respirado ar mais livre durante a maior parte de sua
vida, e não poderia renunciar à liberdade a que estava acostumado.
Contudo, era
de natureza espiritual o motivo mais profundo de sua tristeza. Ele tentara
guardar a lei, mas descobrira que não poderia fazê-lo em virtude de sua
natureza pecaminosa decaída. De que modo, pois, poderia ele ser reto para com Deus?
Com Damasco à vista, aconteceu uma coisa momentosa. Num lampejo cegante, Paulo
se viu despido de todo o orgulho e presunção, como perseguidor do Messias de Deus
e do seu povo. Estevão estivera certo, e ele errado. Em face do Cristo vivo,
Saulo capitulou. Ele ouviu uma voz que dizia: “eu sou Jesus, a quem tu
persegues;. . . Levanta-te, e entra na cidade, onde te dirão o que te convém
fazer” (Atos 9.5 e 6). E Saulo obedeceu. Durante sua estada na cidade, “esteve
três dias sem ver, durante os quais nada comeu nem bebeu” (Atos 9.9). Um
discípulo residente em Damasco, por nome Ananias, tornou-se amigo e
conselheiro, um homem que não teve receio de crer que a conversão de Paulo’
fora autêntica. Mediante as orações de Ananias, Deus restaurou a vista a Paulo.
Sua
personalidade:
As epístolas
de Paulo são o espelho de sua alma. Revelam seus motivos íntimos, suas mais
profundas paixões, suas convicções fundamentais. Sem a sobrevivência das cartas
de Paulo, ele seria para nós uma figura vaga, confusa. Paulo estava mais
interessado nas pessoas e no que lhes acontecia do que em formalidades
literárias. À medida que lemos os escritos de Paulo, notamos que suas palavras
podem vir aos borbotões, como no primeiro capítulo da carta aos Gálatas. Às
vezes ele irrompe abruptamente para mergulhar numa nova linha de pensamento.
Nalguns pontos ele toma um longo fôlego e dita uma sentença quase sem fim.
Temos em 2 Coríntios 10.10 “Pois alguns dizem: As cartas dele são duras e
fortes, mas ele pessoalmente não impressiona, e a sua palavra é desprezível”, uma
pista de como as epístolas de Paulo eram recebidas e consideradas. Mesmo seus
inimigos e críticos reconheciam o impacto do que ele tinha para dizer, pois
sabemos que comentavam: “as cartas, com efeito, dizem, são graves e fortes”.
Líderes fortes, como Paulo, tendem a atrair ou repelir os que eles buscam
influenciar. Paulo tinha tanto seguidores devotados quanto inimigos figadais.
Como conseqüência, seus contemporâneos mantinham opiniões variadíssimas a seu
respeito. Os mais antigos escritos de Paulo antedata a maioria dos quatro
evangelhos. Refletem-no como um homem de coragem (2 Coríntios 2.3 “Escrevi como
escrevi para que, quando eu for, não seja entristecido por aqueles que deveriam
alegrar-me. Estava confiante em que todos vocês compartilhariam da minha
alegria”), de integridade e elevados motivos (Versículos 4 e 5 “Pois eu lhes
escrevi com grande aflição e angústia de coração, e com muitas lágrimas: não
para entristecê-los, mas para que soubessem como e profundo o meu amor por
vocês. Se alguém tem causado tristeza, não o tem causado apenas a mim, mas
também, em parte, para eu não ser demasiadamente severo, a todos vocês”), de
humildade (Versículos 6 “A punição que lhe foi imposta pela maioria é
suficiente”), e de benignidade (Versículos 7 “Agora, pelo contrário, vocês
devem perdoar-lhe e consolá-lo, para que ele não seja dominado por excessiva
tristeza”). Paulo sabia diferençar entre sua própria opinião e o “mandamento do
Senhor” (1 Coríntios 7.25 “Quanto às pessoas virgens, não tenho mandamento do Senhor,
mas dou meu parecer como alguém que, pela misericórdia de Deus, é digno de
confiança”).
Era humilde bastante para dizer “segundo minha opinião” sobre
alguns assuntos (1 Coríntios 7.40 “Em meu parecer, ela será mais feliz se
permanecer como está; e penso que também tenho o Espírito de Deus”). Ele estava
bem cônscio da urgência de sua comissão (1 Coríntios 9.16 e 17 “Contudo, quando
prego o evangelho, não posso me orgulhar, pois me é imposta a necessidade de
pregar. Ai de mim se não pregar o evangelho! Porque, se prego de livre vontade,
tenho recompensa; contudo, como prego por obrigação, estou simplesmente
cumprindo uma incumbência a mim confiada”), e do fato de não estar fora do
perigo de ser “desqualificado” por sucumbir à tentação (1 Coríntios 9.27 “Mas
esmurro o meu corpo e faço dele meu escravo, para que, depois de ter pregado
aos outros, eu mesmo não venha a ser reprovado”). Ele se recorda com pesar de
que outrora perseguia a igreja de Deus (1 Coríntios 15.9 “Pois sou o menor dos
apóstolos e nem sequer mereço ser chamado apóstolo, porque persegui a igreja de
Deus”).
Leia o
capítulo 16 da carta aos Romanos com especial atenção à atitude generosa de
Paulo para com os seus colaboradores. Ele era um homem que amava e prezava as
pessoas e tinha em alto apreço a comunhão dos crentes. Na carta aos Colossenses
vemos quão afetivo e amistoso Paulo poderia ser, mesmo com cristãos com os
quais ainda não se havia encontrado. (Colossenses 2.1 “Quero que vocês saibam
quanto estou lutando por vocês, pelos que estão em Laodicéia e por todos os que
ainda não me conhecem pessoalmente”). Na carta aos Colossenses lemos também a
respeito de um homem chamado Onésimo, escravo fugitivo (Colossenses 4.9 “Ele
irá com Onésimo, fiel e amado irmão, que é um de vocês. Eles irão contar-lhes
tudo o que está acontecendo aqui” e Filemom 1.10 “apelo em favor de meu filho
Onésimo, que gerei enquanto estava preso”), que evidentemente havia
acrescentado ao furto o crime de abandonar o seu dono, Filemom. Agora Paulo o
havia conquistado para a fé cristã e o persuadira de voltar ao seu Senhor. Mas
conhecendo a severidade do castigo imposto aos escravos fugitivos, o apóstolo
desejava convencer a Filemom a tratar Onésimo como irmão. Aqui vemos Paulo, o
reconciliador. E tudo isso ele fez a favor de um homem que estava no degrau
mais baixo da escada da sociedade romana. Contraste essa atitude com o
comportamento do jovem Saulo guardando as vestes dos apedrejadores de Estevão.
Observe quão profundamente Paulo havia mudado em sua atitude para com as
pessoas. Nesses escritos vemos Paulo como amigo generoso, afetivo, um homem de
grande fé e coragem mesmo em face de circunstâncias extremas. Ele estava
totalmente comprometido com Cristo, quer na vida, quer na morte. Seu testemunho
é profundamente firmado nas realidades espirituais: Filipenses 4.12 e 13 “Sei o
que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver
contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo
muito, ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece”.
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