O segundo livro do Novo Testamento e o mais antigo dos
quatro evangelhos, de acordo com a maioria dos estudiosos do Novo Testamento. O
Evangelho de Marcos retrata a pessoa de Jesus mais pelo que Ele faz do que pelo
que Ele diz. É caracterizada por um estilo vívido e direto que deixa a
impressão de familiaridade com os eventos originais.
Embora Marcos seja o mais curto dos quatro evangelhos,
presta muita atenção a questões de interesse humano. Marcos gosta de ligar os
episódios do ministério de Jesus com palavras de ordem (por exemplo,
“imediatamente”, “então”), em vez de comentários editoriais; e frequentemente
ele interrompe uma história mais longa inserindo uma menor dentro dela (Marcos
5.21 a 43, 6.6 a 30, 11.12 a 25 e 14.1 a 11).
Importância do Evangelho de Marcos
Este Evangelho, o segundo dos livros do Novo Testamento,
contém pouco material que não apareça igualmente em Mateus e Lucas. Apenas
cinco passagens de Marcos (3.7 a 12, 4.26 a 29, 7.32 a 37, 8.22 a 26 e 14.51 e
52) e alguns versículos isolados não foram registrados nos outros dois
Evangelhos. Por essa razão, durante muito tempo, não se deu a Marcos a
importância teológica e literária que realmente tem.
No entanto, desde o século 19, começou a firmar-se a ideia
de que o “segundo Evangelho” foi básico na preparação de Mateus e Lucas. E, ao
considerar-se assim que Marcos é o documento mais antigo que possuímos sobre a
vida e a obra de Jesus, foi despertado um grande interesse por estudá-lo.
Autor
A opinião mais generalizada identifica o autor do nosso
Evangelho com João Marcos (ou só João), parente de Barnabé (Colossenses 4.10) e
filho de Maria, a qual morava em Jerusalém, em uma casa que dispunha de um
“cenáculo onde se reuniam” os apóstolos (Atos 1.13 e 12.12). Foi colaborador de
Paulo (Atos 12.25 e 13.5 e 13, 15.37 e 39, 2 Timóteo 4.11 e Filemom 24) e,
talvez, discípulo de Pedro, que na sua primeira carta o menciona como “meu
filho Marcos” (1 Pedro 5.13).
Marcos não é um historiador no sentido que hoje damos ao
termo. Antes, é um narrador que conta o que chegou ao seu conhecimento. Escreve
em grego, com a rusticidade característica de quem está usando um idioma que
não lhe é próprio e, contudo, sabe desenvolver um estilo vivo e vigoroso.
Recorre, provavelmente, à memória de coisas ouvidas, mas é capaz de criar no
leitor a impressão de encontrar-se ante uma testemunha ocular dos fatos
relatados.
Propósito do Evangelho
Marcos não parece preocupado com questões biográficas.
Exemplo disso é a ausência na sua obra de uma história do nascimento e da
infância de Jesus, da maneira como o fazem Mateus e Lucas. Ademais, em termos
gerais e excetuando talvez os capítulos da prisão, julgamento, crucificação e
ressurreição do Senhor (14 a 16), os dados cronológicos consignados pelo
evangelista não permitem estabelecer com precisão a ordem em que ocorrem os
acontecimentos.
O que realmente importa ao evangelista é testificar que à
pergunta sobre quem é Jesus a primeira comunidade cristã respondeu com
convicção: Jesus é o Filho de Deus. E, fazendo-se eco dessa afirmação de fé,
Marcos inicia a sua mensagem enunciando solenemente: “Princípio do evangelho de
Jesus Cristo, Filho de Deus” (1.1, conferir também 1.11, 3.11, 5.7, 9.7, 14.61
e 15.39).
Características teológicas e literárias
Este Evangelho proclama em cada uma das suas páginas que
Jesus é a revelação definitiva de Deus, o qual, em seu Filho eterno, se integra
na história da humanidade: Jesus, o singelo mestre chegado da Galileia (1.9), é
o Cristo, o Messias a quem desde séculos antigos esperava o povo de Israel
(8.29, 9.41, 14.61 a 62). O evangelista anuncia a presença de Jesus no mundo
como o sinal imediato da vinda do reino de Deus (1.14 e 15, 4.1 a 34).
A personalidade de Jesus, entretanto, não satisfaz às
expectativas judaicas, pois longe de apresentar-se como messias político e
militar, o faz como um homem humilde cuja atividade e ensinamentos não
correspondiam à imagem triunfante de um libertador nacional.
Jesus de Nazaré, o Filho de Deus, é também o Filho do Homem.
Participa dos sentimentos humanos e é sujeito ao sofrimento e à morte (8.31).
Com consciência da sua natureza humana, exige frequentemente que a sua função
messiânica se mantenha em segredo (1.43 e 44, 5.43, 8.29 a 30, 9.9,30 e 31),
até que chegue o momento de ser acreditada pelos padecimentos morais e físicos
que ele deverá enfrentar (14.35 e 36, 15.39).
Uma característica típica de Marcos é que dedica mais espaço
aos atos que aos discursos de Jesus. Na realidade, só dois desses últimos podem
ser considerados como tais: a série de parábolas de 4.1 a 34 e o sermão
escatológico de 13.3 a 37. Tudo mais são breves intervenções de ensinamento,
exortação ou controvérsia. Por outro lado, o evangelista concede à descrição
dos atos um espaço mais amplo, inclusive, às vezes, superior ao que Mateus e
Lucas dedicam a narrativas paralelas (conferir Marcos 5.21 a 43 com Mateus 9.18
a 26 e Lucas 8.40 a 56 e Marcos 6.14 a 29 com Mateus 14.1 a 12).
À medida que progride, o desenvolvimento dramático do
segundo Evangelho cresce em intensidade, até alcançar o seu ponto culminante no
relato da paixão, crucificação e ressurreição de Jesus. O Senhor anuncia três
vezes esses acontecimentos aos seus discípulos: “O Filho do Homem será entregue
aos principais sacerdotes e aos escribas... e o entregarão aos gentios; hão
de... matá-lo; mas, depois de três dias, ressuscitará”. Os discípulos não
compreenderam até o último momento que o sacrifício de Jesus Cristo fazia parte
do plano de salvação de que Deus o havia incumbido (8.32 a 38 e 16.19 a 20).
Leitores, tempo e lugar
Com respeito à composição de Marcos, é provável que teve
lugar em Roma ou, talvez, na Antioquia da Síria, antes do ano 70, data em que
Jerusalém foi destruída. Não há base cronológica que permita datá-la com
exatidão, de forma que alguns historiadores a situam entre 65 e 70, isto é, nos
anos que seguiram à perseguição de 64, decretada por Nero; outros situam a data
em torno do ano 63; e ainda outros a fazem retroceder até a década de 50.
A antiga tradição eclesiástica viu neste Evangelho a
influência dos ensinamentos de Pedro, de quem Marcos teria sido discípulo. Em
princípio, foi escrito para leitores de origem gentílica, residentes fora da
Palestina. Assim o sugere, entre outras peculiaridades, o fato de que o autor
acrescenta à tradução grega expressões cujo original aramaico incorpora ao
texto com a maior fidelidade (5.41, 7.11 e 34, 14.36, 15.22 e 34).
Estrutura do Evangelho
A estrutura formal de Marcos tem dado lugar a diversas
análises e a diferentes possibilidades de dividir o texto. A que mais adiante
se oferece toma como base a revelação progressiva que Jesus faz de si mesmo: por
um lado, a sua personalidade (1.7 a 11, 4.41, 8.27 a 29, 9.7), o seu poder
frente à natureza, à dor e à morte (1.30 e 31 e 40 e -42, 2.3 a 12, 4.37 a 39, 5.22
a 42, 6.45 a 51) e a sua luta contra as forças do mal (1.24 a 27, 3.11, 5.15 e 19,
9.25 a 27); por outro lado, a índole da sua missão, primeiro como mestre e
profeta (1.37 a 39, 2.18 a 28, 3.13 a 19 e 23 a 29, 4.1 a 34, 9.2 a 10.45, 13.3
a 37, 14.61 a 62) e definitivamente como Senhor e Salvador (16.15 a 18).
Estrutura Literária
O Evangelho de Marcos cai naturalmente em duas metades, a
primeira sobre o ministério de Jesus na Galileia (1.1 a 8.26), e a segunda sua
jornada para Jerusalém e sua paixão por lá (8.27 a 16.8). A primeira metade
começa com a declaração do propósito do evangelho (1.1), seguido do
aparecimento de João Batista (1.2 a 8) e do batismo de Jesus (1.9 a 11). A
tentação no deserto é mencionada, mas não elaborada (1.12 e 13), e a introdução
conclui com uma cápsula da mensagem de Jesus: “Chegou a hora. O reino de Deus
está próximo. Arrependa-se e acredite nas boas novas!” (1.14 e 15).
Em seguida, segue uma série de treze vinhetas cuidadosamente
elaboradas, retratando Jesus como professor, curador e exorcista em Cafarnaum e
arredores, muitas vezes em conflito com as autoridades judaicas (1.16 a 3.25).
O capítulo 4 é uma assembleia seleta das parábolas de Jesus, a maioria das
quais trata do cultivo de sementes.
Marcos retoma o ministério de Jesus como pregador e curador
ao ar livre em 4.35 a 8.26. Oposição a Jesus de Herodes Antipas e de líderes
religiosos judeus o forçou a deixar a Galileia e embarcar em uma jornada
tortuosa nas regiões gentias da Fenícia e Decápolis. Os “estrangeiros” gentios
exibem uma notável abertura e aceitação de Jesus e do evangelho, enquanto que
os “insiders”, especialmente os discípulos, são tão obstinados quanto os
líderes religiosos, embora não com má intenção.
A segunda metade do Evangelho começa em 8.27, com Jesus não
mais circundando o Mar da Galileia, mas “a caminho” de Jerusalém. O caminho
para Jerusalém começa com a confissão de Pedro em Cesaréia de Filipe. Jesus
pergunta a seus discípulos: “Quem dizem as pessoas que eu sou?” (8.27). Pedro
responde: "Você é o Cristo" (8.29). Jesus choca os discípulos,
explicando que o Cristo deve sofrer e morrer; Além disso, quem quiser ser seu
discípulo deve estar preparado para o discipulado (8.31 a 9.1). Uma gloriosa
transfiguração de Jesus segue esse terrível pronunciamento, que mostra que o
Pai no céu confirma o papel de Jesus como o Filho do homem que sofre (9.2 a 13).
Depois de Cesaréia de Filipe, a narrativa é dirigida
resolutamente a Jerusalém. “No caminho” Jesus três vezes prediz seu iminente
sofrimento, morte e ressurreição (8.31, 9.31, 10.33 e 34). As grandes multidões
que o assistiram na Galileia caíram e Jesus se concentra em ensinar aos Doze o
significado do discipulado. “Quem quiser ser grande entre vós deve ser teu
servo. Pois o próprio Filho do homem não veio para ser servido, mas para servir
e dar a sua vida em resgate de muitos” (10.43 a 45). Embora Jesus entre em
Jerusalém como um peregrino célebre (11.1 a 10), Marcos significa sua ruptura
com a Cidade Santa por sua remoção noturna para Betânia, fora de Jerusalém (11.11)
e por seu julgamento no templo (11.12 a 21).Os capítulos 11 a 13 contêm uma
série de testes e armadilhas dentro e ao redor do templo, a maioria dos quais
evidencia a hostilidade do Sinédrio a Jesus e a correspondente rejeição de
Jesus ao templo. No capítulo 13, a destruição do templo torna-se um símbolo das
aflições que assombrarão os fiéis antes do Dia do Senhor e do retorno do Filho
do Homem. Os capítulos 14 e 15 compreendem o coração do relato da paixão. Uma
solene Última Ceia com os discípulos é ambientada em meio a intrigas e traição,
não apenas por adversários judeus e romanos, mas também por seus discípulos.
Uma prisão clandestina leva a duas audiências, uma pelo Sinédrio judaico (14.53
a 72) e uma por Pôncio Pilatos, o governador romano (15.1 a 20). O acento na
cena da crucificação cai menos no sofrimento físico de Jesus do que em seu
abandono (mesmo por Deus, 15.34) e no escárnio de seus adversários. No momento
da sua morte, um centurião gentio confessa Jesus como o Filho de Deus (15.39).
A derrota é assim transformada em vitória, à medida que o Filho de Deus é
revelado no sofrimento. A forma mais antiga do Evangelho termina com um anúncio
angélico da ressurreição de Jesus (16.1 a 8); um final secundário posterior
inclui várias aparições de ressurreição de Jesus (16.9 a 20).
Teologia
Já que a teologia de Marcos é apresentada na forma de uma
narrativa, resumindo que a teologia realmente significa visualizar a história
de Marcos e destacar alguns de seus principais temas.
A vinda de Jesus marca a chegada do reino de Deus, o reinado
dinâmico de Deus. Suas obras poderosas são as obras de Deus. Seu ensinamento
autoritário interpreta os caminhos de Deus. Suas parábolas misteriosas separam
aqueles com discernimento espiritual daqueles que já rejeitaram Jesus. Aqueles
com olhos para ver, discernem que em todo o Jesus, o reino secreto está sendo
estabelecido.
Quando Pedro confessa a Jesus como o Messias, Jesus volta
sua atenção para os temas inseparáveis do destino do Messias e o caminho do
reino de Deus. Aceitar o reinado de Deus seguindo esse Messias significa auto
sacrifício, servidão, humildade, estar com os fracos e rejeitar os caminhos
famintos por poder e busca de glória do mundo. Significa fidelidade a um
Messias que sofrerá e morrerá. Significa viver pelos valores do reino vindouro,
onde os pensamentos de Deus, não os pensamentos humanos, determinam o que é
certo.
Em Jerusalém, Jesus e sua mensagem são proclamados (às vezes
ironicamente) - pela multidão de festivais, pelo próprio Jesus, pelas
Escrituras e por uma mulher expressando sua devoção a Jesus e,
inadvertidamente, ungindo-o como o Messias. Em Jerusalém, Jesus também é
rejeitado, por Judas, por líderes religiosos, por multidões nacionalistas e por
Pilatos, que cede à pressão e autoriza a execução do verdadeiro Rei de Israel.
Na morte injusta de Jesus, sua verdadeira identidade é
revelada: Ele é o Filho de Deus e o Messias, que deu sua vida para redimir os
outros. Depois de três dias, o crucificado torna-se o ressuscitado. Jesus
oferece novos começos para aqueles que falharam com ele; eles são convidados de
volta a uma vida de discipulado e missão fiéis.
Em 16.8, termina a narrativa de Marcos (16.1 a 8) com uma
mensagem provocativa de ressurreição oferecendo segundas oportunidades aos
discípulos que não seguiram e que têm medo de proclamar boas notícias. Mas a
história de Marcos inclui orientação para o período pós-ressurreição de espera
pelo retorno do Filho do Homem com grande poder e glória. No tempo do fim,
assistir não tem nada a ver com buscar sinais ou esboçar o cronograma de Deus (13).
Aqueles que se mantêm alertas discernem respostas apropriadas a crises de todos
os tipos, proclamam corajosamente o Evangelho, servem e seguem a Jesus até o
fim.
À medida que a narrativa se desdobra, certos temas surgem
como centrais. O mais importante deles é a Cristologia: quem é Jesus? Os
principais títulos de Marcos para Jesus são Cristo e Filho de Deus. O sigilo
envolve os dois títulos, porque seu verdadeiro significado só pode ser
entendido por aqueles que aceitam o caminho da cruz.
Características
O evangelho de Marcos é o mais breve dos evangelhos do
cânon. E conciso e repleto de ação, uma característica que seria cativante para
a mente prática dos romanos, para quem, sem dúvida, foi originariamente
escrito. A parte dedicada aos atos de Jesus, em comparação com as suas
palavras, é maior no evangelho de Marcos do que nos outros. Dezoito milagres
são registrados, em contraste com apenas quatro parábolas completas. Nota-se um
número excepcionalmente grande de relatos de expulsão de demônios por parte de
Jesus (1.23 a 27 e 32 a 34, 3.11 e 22 a 27, 5.1 a 20, 7.25 a 30, 9.17 a 29). O
evangelho fornece poucos comentários acerca desses acontecimentos, e em geral
as ações falam por si mesmas. Diferentemente de biografias comuns, o evangelho
de Marcos não relata nada acerca do nascimento de Jesus, seu crescimento e
aparência; tampouco especifica a duração do seu ministério público, nem sua
idade na época da crucificação. Cerca de um terço do relato é dedicado à
descrição dos oito dias entre a entrada de Jesus montado no jumento e sua
ressurreição.
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